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Duas professoras e um mesmo objetivo: promover o programa Esse Rio é Meu junto aos estudantes da Escola Municipal Edgard Werneck

Entrevista com Márcia Bandeira e Tatiana Mattos.

Por Marcus Tavares

Duas professoras e um mesmo objetivo: apresentar e desenvolver o programa Esse Rio é Meu junto aos estudantes das turmas 1601 e 1602 da Escola Municipal Edgard Werneck, localizada na Freguesia, Jacarepaguá, Zona Oeste do Rio. Desde o início do ano, Márcia Bandeira Costa de Mendonça e Tatiana de Souza Mattos Braga vêm se debruçando sobre o projeto e promovendo ações que estão instigando os alunos a conhecerem o rio Sangrador e a importância da sua recuperação para toda a comunidade.

O programa Esse Rio é Meu é desenvolvido em conjunto pela Secretaria Municipal de Educação e pela Secretaria Municipal de Meio Ambiente da Prefeitura do Rio, em parceria com a oscip planetapontocom e a concessionária Águas do Rio – patrocinadora do programa. O objetivo do programa é engajar escolas na recuperação e preservação dos rios. Cada grupo de escolas da rede pública de ensino do Rio ficou responsável por desenvolver ações em torno de um dos corpos hídricos da cidade.

Professoras do Fundamental II, elas vêm trabalhando em conjunto e descobrindo, na prática, o quanto, pela educação, é possível mudar cenários: “No início, achamos que seria complexo o trabalho, não conseguia visualizar de que forma poderíamos colaborar com a preservação do rio que não fosse trabalhar na limpeza através de mutirões – o que achava arriscado para a segurança e saúde dos estudantes. Mas depois fomos vendo que essa transformação no rio poderia acontecer ‘dentro’ de nossos alunos, através do conhecimento e da consciência a respeito de sua história, conservação e da disseminação destas informações. A partir daí ficou cada vez mais empolgante o processo”, contam em entrevista à revistapontocom.

Processo que também incentivou e promoveu o desenvolvimento de competências e habilidades em diferentes áreas de conhecimento, mas principalmente na área de Língua Portuguesa. Os alunos foram convidados a expressarem seus sentimentos e reflexões por meio de poesia e outros gêneros textuais. Uma rica experiência que aliou conteúdo, conhecimento e criatividade.

Em entrevista à revistapontocom, as professoras contam detalhes do programa realizado na escola. Explicam como aconteceu cada etapa e, nas entrelinhas, deixam claro o poder que a educação, a escola pública, tem de promover mudanças significativas no dia a dia dos estudantes e de suas famílias.

Acompanhe:

revistapontocom – Vocês são professoras de qual área de conhecimento? Há quanto tempo estão na escola? Na rede municipal?
Márcia Bandeira e Tatiana Mattos –
Somos professoras das turmas de sexto ano e lecionamos em um projeto experimental que acabou sendo consolidado. Somos responsáveis pelas disciplinas de Língua Portuguesa, Matemática, História, Geografia e Ciências. Eu, Márcia, fiz o curso de formação de professores no Ensino Médio e depois me formei em Psicologia, com especialização em Educação Inclusiva. Sou professora da rede municipal há 37 anos, há sete anos como regente em turma de sexto ano, nessa unidade escolar.  Já eu, Tatiana, sou graduada na área de Língua Portuguesa, Inglês e Literatura, com especialização em Linguística e Língua Portuguesa. Estou na escola há nove anos, mas há oito leciono para as turmas de sexto ano. Na rede municipal, há doze anos. Na rede privada, há 31 anos.

revistapontocom – Como esse projeto nasceu na escola? Como essa parceria entre vocês duas aconteceu?
Márcia Bandeira e Tatiana Mattos
– O projeto nos foi apresentado pela CRE, com algumas opções para o enfoque no desenvolvimento. Optamos por História e pertencimento, já que este ano o projeto da nossa escola também tem esse enfoque. No projeto anual estamos celebrando os vinte anos da Lei 10639/03 que alterou a Lei de Diretrizes e Bases da Educação e incluiu, no currículo oficial da rede de ensino, a obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-Brasileira e Africana”, valorizando sua influência na formação do povo brasileiro. Em nossa unidade escolar, o programa Esse Rio é Meu está sendo desenvolvido pelas turmas do 6º ano e, embora estejamos em turnos diferentes, estamos constantemente em contato planejando e realizando as etapas propostas.

revistapontocom – Já haviam trabalhado com esse tema na escola?
Márcia Bandeira e Tatiana Mattos –
Especificamente sobre os rios da região, não.

revistapontocom – Como o projeto aconteceu na prática?
Márcia Bandeira e Tatiana Mattos
– O projeto teve início com a localização geográfica do rio Sangrador e do córrego da Panela, para isso utilizamos mapas e o Google Earth. Após a análise desse material, assistimos ao vídeo “Quem está poluindo o rio Sangrador?” (Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=9fk-65YUkhs) onde a advogada Veronica Beck, especialista em legislação ambiental, percorre todo o trajeto do rio Sangrador, mostrando os locais onde é possível visualizá-lo e a partir de que trecho ele está mais poluído. Foi uma importante experiência, pois, a partir daí, os estudantes passaram a identificar os locais por onde passam, onde alguns parentes trabalham ou próximo às suas casas, gerando o sentimento de pertencimento e cuidado com o rio que pretendíamos. Foi por meio do vídeo que também descobrimos que o rio Sangrador, que antigamente se chamava Porta D’água, carrega águas de alguns rios que nascem no Parque Nacional da Tijuca, na vertente que dá para o lado de Jacarepaguá, atravessando mais de 9 km o bairro da Freguesia. E que ao receber águas de outros rios, próximo ao Bosque da Freguesia, passa a se chamar Córrego da Panela. É um rio que já foi navegável em toda a sua extensão, mas que infelizmente está totalmente canalizado, assoreado e muito poluído. Entretanto, no vídeo, verificamos que boa parte da poluição que carrega não advém de uma área carente, mas, sim, de diversos imóveis, devidamente legalizados pela Prefeitura, que foram sendo construídos nesse entorno. E justamente por ser fácil identificar quem são os poluidores, acredita-se que seja um rio de fácil recuperação. O rio não é valão, não é um canal pelo qual o esgoto corre a céu aberto. Qualquer rio de água doce é um recurso hídrico que poderá nos socorrer em tempos de seca. A natureza fez a parte dela, falta a gente fazer a nossa.

revistapontocom – E depois, o que foi realizado?
Márcia Bandeira e Tatiana Mattos –
Em seguida, os alunos realizaram pesquisas sobre o rio e, através de uma roda de conversa, trocaram informações com a turma e colocaram as curiosidades e dúvidas surgidas durante a pesquisa. Alguns alunos trouxeram relatos de familiares a respeito do córrego da Panela, que era utilizado para o banho. Na sequência, propusemos aos estudantes que realizassem registros fotográficos do rio nos trajetos por onde passam. Nesta altura, já tínhamos criado uma forte identidade e pertencimento entre os estudantes e o rio. E, com o objetivo de explorar a produção textual, promovemos uma oficina de poemas sobre o rio Sangrador e córrego da Panela a partir das informações que os alunos já tinham e de pesquisas realizadas. O trabalho foi estendido para outros gêneros textuais que vinham sendo trabalhados, como as cartas, avisos e paródias, por exemplo. E não parou por aí. Resolvemos promover também rodas de conversa com representantes e especialistas. Recebemos a visita de Yuri Leal de Amorim, diretor da Associação de Moradores e Amigos da Freguesia (AMAF) e professor de história, e de Leilo Augusto de Campos Araújo, professor e membro da AMAF. Foram apresentados mapas que datam de mais de 200 anos atrás e que mostram os rios como canais de transporte para o escoamento das produções do então conhecido como Sertão Carioca. Foi uma aula de história incrível onde os alunos, e nós professoras, aprendemos muito, já que muitas dessas informações não são encontradas facilmente. Em outra ocasião, recebemos a visita da engenheira Patrícia Montezuma e da assistente social Edenilza Cesário, funcionárias da Fundação Rio-Águas, para uma conversa sobre as obras realizadas nos rios da nossa cidade, como é feita a manutenção desses rios, como podemos ajudar e evitar as enchentes no nosso entorno, entre outros assuntos importantes relacionados ao rio em questão. Foi uma conversa bastante interessante e, ao final, os alunos ainda ganharam brindes do João Carioca, mascote da Fundação. E, como última atividade, ainda realizamos um seminário. Reunimos Yuri Leal, diretor da AMAF, Veronica Beck, advogada e professora, membro do Subcomitê da Bacia Hidrográfica de Jacarepaguá e da AMAF; e Marcelo Calvano, líder no Rio de Janeiro da ONG Instituto Limpa Brasil. Yuri falou sobre a história dos rios da nossa região e a importância de preservá-los. A Advogada Veronica Beck falou sobre o problema do lixo nos recursos hídricos e as consequências disso para a fauna que habita nossos mares e para os próprios seres humanos, as áreas de proteção ambiental e a campanha pela criação de uma nova área de preservação permanente em Jacarepaguá. Já Marcelo nos contou um pouco sobre o Instituto @limpabrasil, o #diamundialdalimpeza e o movimento #criancasquelimpam, destacando a importância do descarte correto dos resíduos, principalmente do plástico.

revistapontocom – Como foi a receptividade dos estudantes?
Márcia Bandeira e Tatiana Mattos –
Muito boa, durante o processo foram se identificando, prestando maior atenção ao rio que corre ao longo do caminho diário de muitos deles. As turmas gostaram do tema, passaram a buscar informações a respeito com familiares que moram há muito tempo no entorno e, com a participação nas rodas de conversa e seminário, conseguiram identificar conceitos geográficos trabalhados em sala na fala dos convidados, além de demonstrarem satisfação ao cumprir a tarefa dada de tirar uma foto com o rio, reconhecendo o mesmo como parte da paisagem do trajeto diário escola-casa, casa-escola.

revistapontocom – O programa possibilitou um trabalho interdisciplinar? Inclusive quando falamos em avaliação?
Márcia Bandeira e Tatiana Mattos
Sim, vários pontos foram abordados possibilitando a interdisciplinaridade, principalmente nas áreas de Geografia e História, além da criatividade e protagonismo dos alunos.

revistapontocom – E pelo relato de vocês, houve uma grande produção textual literária de poesias e outros gêneros textuais. Como isso aconteceu?
Márcia Bandeira e Tatiana Mattos –
Por ser professora especialista na área de Língua Portuguesa e uma amante das poesias, achei que poderíamos experimentar uma oficina de poemas e eles surpreenderam. Fizemos um concurso onde os próprios alunos elegeram os melhores, os três primeiros colocados receberam uma barra de chocolate. Em paralelo, eu (professora Márcia) realizei com minha turma uma atividade denominada “Os gêneros textuais e o rio”, onde a turma se dividiu em duplas ou trios e produziu  textos diversos.

Rio Sangrador
Rio Sangrador
Um rio muito belo
Na Serra Grajaú Jacarepaguá
Dá até vontade de nadar

Porém, entretanto, todavia,
O rio está sendo poluído
O que causa muita tristeza
Para mim e para meus amigos

Mas isso pode ser revertido
Com a ajuda de todos nós
Com menos lixo, esgoto e poluição
Será melhor para a Freguesia

(Maria Rosa – 1602)

Sangrador, o esplendor
Há muito tempo
Deixei de ser limpo
O lixo e eu
Somos companheiros

As pessoas a jogar
Sem ligar
Minhas águas claras
Há muito tempo
Escuras ficaram

Os peixes que
Em mim nadavam
Aqui não estão mais
Meu fedor, um horror
O esgoto
A esgotar minha beleza

(Thaylan – 1602)


O rio Sangrador
O rio Sangrador
Não é apenas um rio
É a marca registrada
Da estrada dos Três Rios

Poluir o rio não é legal
Mas se limparmos
Fica sensacional

Ele é muito importante
E tem pontos
Positivos e negativos

O ponto negativo
São as pessoas poluindo
E o fedor subindo

O ponto positivo
É que muitas pessoas
Pensam sobre isso

(Valentina – 1602)

Águas da Freguesia
Rio Sangrador
Pela Freguesia correndo
Dá pra ver a dor

A poluição?
Não é brincadeira não
Se cuidássemos do rio
Viveríamos em comunhão

Mais pra frente vira córrego Panela
E os montes de lixo
Já passaram da canela

(Charles Breno – 1602)


Rio Sangrador
No começo tá limpinho, no final tá sujinho
A cada curva, mais sujo fica
O rio chora de dor
Sangra, pois o maltratam jogando lixo

Todo dia ele chora um pouquinho
A cada mês que se passa
Ele morre um pouquinho
Ele necessita de ajuda

Hoje ele necessita de nós
Amanhã talvez possamos necessitar dele
Vamos ajudá-lo
Para que no futuro ele possa nos ajudar

(Rebeca – 1602)


Esperança
O rio Sangrador é um rio viajante
Que passeia pela Freguesia
Transportando sua poluição e solidão

É um rio muito antigo
Que leva memórias e lembranças
Inclusive a esperança

A esperança de que uma hora
A atitude do ser humano irá mudar
E um dia
Limpo ele novamente será

(Eduarda – 1602)


Olá, rio Sangrador!

Queremos te dizer que você é muito importante, sabia disso? Você faz parte do trabalho que estamos fazendo na escola. Você está bem sujo, mas acreditamos que dá tempo de mudar isso e limpar você. Estamos na escola fazendo muitos estudos sobre você e nos preocupamos com a poluição das suas águas. Descobrimos que você é bem grande e achamos você muito bonito. Você é o rio mais importante da Freguesia!

Dos amigos,
Pedro Henrique e Pedro Miguel.

(Pedro Henrique e Pedro Miguel – 1601)

Rio de Janeiro, 3 de outubro de 2023.

Olá, rio Sangrador! Como você tem passado?

Caminhando na Freguesia, passamos por você e não te achamos muito bem…Queremos te contar que na nossa escola as turmas do sexto ano estão participando do projeto “Esse rio é meu” e estamos conhecendo mais você, porque você e o Córrego da Panela foram os nomes que recebemos para estudar. Estamos admirados com as informações que estamos recebendo. Tiramos fotos com você e ficaram lindas. Futuramente daremos mais notícias.

Com carinho, 
Marley e Maria Eduarda Rocha

(Marley e Maria Eduarda Rocha – 1601)


AVISO
ATENÇÃO, FREGUESIA!
O RIO SANGRADOR PEDE SOCORRO!
INFORME-SE E COLABORE.
PROCURE A AMAF.

(Breno e Nicolas – 1601)


Paródia da música popular “Se essa rua fosse minha”
Se esse rio, se esse rio fosse meu
Eu mandava, eu mandava lá limpar
Retirando, retirando todo o lixo
Para a vida nele ver voltar

Esse rio tem um nome
Que se chama, que se chama, Sangrador
No caminho dele tem um córrego
Córrego da Panela, sim, senhor!

Se a Freguesia roubou seu coração
É porque tu roubaste o dela também
Se a Freguesia roubou seu coração
É porque ela te quer, ela te quer bem.

(Érick, Lucas Matheus e Pietro – 1601)


Rio Sangrador,

Obrigado por tornar a paisagem da Freguesia especial.
Em breve vamos te visitar.

Um abraço, Oziel e Samuel.

(Oziel e Samuel – 1601)

revistapontocom – Que avaliação vocês fazem sobre o programa Esse Rio é Meu?
Márcia Bandeira e Tatiana Mattos
No início, achamos que seria complexo o trabalho, não conseguia visualizar de que forma poderíamos colaborar com a preservação do rio que não fosse trabalhar na limpeza através de mutirões – o que achava arriscado para a segurança e saúde dos estudantes. Mas depois fui vendo que essa transformação no rio poderia acontecer “dentro” de nossos alunos, através do conhecimento e da consciência a respeito de sua história, conservação e da disseminação destas informações. A partir daí ficou cada vez mais empolgante o processo. O projeto é muito interessante, pois destaca uma parte da paisagem do nosso entorno até então invisibilizada no nosso objeto de estudo. Os alunos estão muito empolgados com o movimento que o projeto trouxe para nossa escola, com a presença dos parceiros colaboradores que vieram compartilhar seus conhecimentos conosco. No início do segundo semestre, uma atividade do Material RioEduca Geografia nos chamou atenção. Ela propõe a criação de um museu no lugar onde vivemos. Essa atividade inspirou a criação do nosso “Museu do rio Sangrador”, para a atividade de culminância, trazendo uma dinâmica interessante para a organização do material produzido.

revistapontocom – Quais são os próximos passos?
Márcia Bandeira e Tatiana Mattos
– O último passo será a apresentação de tudo que aprendemos para a nossa comunidade escolar. Vamos criar o “Museu do rio Sangrador”, onde faremos uma espécie de circuito em que os visitantes seguirão o trajeto de um “rio” pintado no chão para conhecer 5 estações, cada uma delas abordando um dos conhecimentos desenvolvidos neste trabalho. Estamos pensando em algo bastante interativo utilizando jogos, enquetes, apresentação dos registros feitos pelos alunos, etc. Este evento deverá acontecer no final de novembro.

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