Flipetrópolis homenageia Sylvia Orthof, escritora infantil da ‘eterna fada fofa’

Escritor Leo Cunha, curador da programação infantil, conta detalhes.

A programação infantil do Festival Literário Internacional de Petrópolis, que aconteceu entre os dias 1° e 5 de maio, foi encerrada com um sarau em homenagem a escritora Sylvia Orthof (1932-1997), atriz e escritora petropolitana de livros infantis, a “eterna fada fofa”.

A apresentação começou com Leo Cunha declarando que “somos irmãos em Orthof”. O escritor Tino Freitas cantou a música que fez em homenagem à personagem Uxa, do livro “Uxa, ora fada, ora bruxa”; Flávia Justen contou a história do livro “Se as coisas fossem mães” interagindo com a plateia. Marta Lagarta, inspirada por Sylvia, escreveu seu livro “Se tudo fosse parente”, base da sua apresentação interativa com a plateia. Em seguida, Lucia Tucuju, escritora indígena, subiu ao palco com seu maracá – instrumento musical indígena – e, com Marta, divertiu o público. Fernando Viana contou que foi convidado por Sylvia para trabalhar com ela no fim dos anos 1980 e até hoje leva o nome de Sylvia por onde anda.

Alex Gomes contou que Sylvia foi convidada a escrever para a revista Recreio e recitou alguns trechos publicados. Ao fim do sarau, Tino Freitas voltou ao palco, leu um poema e, com muita emoção, cantou “Fada Tapioca. A ideia do sarau em homenagem à escritora foi idealizada pelo escritor Leo Cunha. Autor de mais de 60 livros, entre literatura infantil e juvenil, crônicas e poesia, Léo também publicou contos e poemas em diversas antologias.

Em entrevista à revistapontocom, Leo, amigo e fã de Sylvia Orthof, contou detalhes sobre a programação do sarau e explicou a importância de Sylvia no cenário da literatura infanto-juvenil brasileira.

Acompanhe a entrevista:

revistapontocom – A primeira edição do Flipetrópolis prestou uma grande homenagem à escritora Sylvia Orthof. O que isso significa?
Leo Cunha –
Como era a primeira edição do Flipetrópolis, achei que seria importante homenagear uma grande escritora local, a maior escritora de literatura infantil que nasceu em Petrópolis e que viveu grande parte da sua vida em Petrópolis: Sylvia Orthof (1932-1997). Como curador da programação infantil, propus esse grande sarau, reunindo escritores do evento que tivessem uma relação direta com a obra da Sylvia. Como escritor e meio afilhado literário, posso dizer que Sylvia foi muito importante na minha carreira e influenciou minha escrita. Participaram do sarau a escritora Marta Lagarta; o Fernando Viana, que é um ator de Petrópolis e que foi por pupilo da Sylvia; o Alex Gomes, escritor e pesquisador da revista Recreio; e o Tino Freitas, outro escritor muito influenciado pela Sylvia. Então, reuni autores que poderiam prestar essa homenagem, seja contando histórias dela ou contando, às vezes, as suas próprias histórias inspiradas pela Sylvia. O sarau ganhou o nome de Fada Fofa, uma personagem marcante e recorrente na obra de Sylvia.

revistapontocom – Para quem não conheceu a escritora e sua obra, como você a apresentaria?
Leo Cunha –
Sylvia Orthof foi um grande nome da literatura Infanto-juvenil brasileira, nos anos 80 e 90. Infelizmente morreu nova, com 65 anos, mas deixou mais de 100 livros publicados e várias peças de teatro. Ganhou vários prêmios, o que era raro, porque era, basicamente, uma autora de humor. Sabemos que o humor é muito pouco premiado não só no Brasil, mas no mundo inteiro. Sylvia era uma pessoa adorada por todo mundo, muito autêntica e divertida. Às vezes, ela mesma se chamava de Dercy Gonçalves da literatura infantil. Não pelos palavrões, mas pelo jeito autêntico, coloquial e brincalhão de se comportar nas reuniões, nas festas, em todo lugar. A literatura dela espelhava muito isso. Era uma literatura com humor, nonsense, toques de absurdo, surrealismo, mas também altamente poética, com muita delicadeza e grandes sacadas. Sylvia criou uma grande legião de admiradores exatamente por mesclar esses dois lados, o lado carnavalesco, da festa, da bagunça, do humor, com o lado poético que tinha nas suas obras.

revistapontocom – Na homenagem que você participou, você iniciou declarando: “somos irmãos em Orthof”. O que você quis dizer?
Leo Cunha –
Faço parte de um grupo informal de escritores, ilustradores, editores que gostamos de nos identificar como ‘irmãos em Orthof’. Por que isso?  A grande geração de escritores dos anos 70, da literatura infantil, que começou na revista Recreio, foi frequentemente chamada de Filhos de Lobato. Estão neste grupo: Ana Maria Machado, Ruth Rocha, Pedro Bandeira, Maria Heloísa Penteado e a própria Silvia Orthof. Trata-se de um grupo muito influenciado pela obra do Lobato, pela Emília, pela irreverência, pelo nacionalismo. São os Filhos de Lobato. Nós somos os ‘irmãos em Orthof’. O grupo foi criado durante uma conversa. Tivermos a felicidade de conviver com Sylvia e sermos influenciados por ela. Fazem parte deste grupo, por exemplo, Edmir Perrotti, da editora Paulinas; Helena Rodarte, da Ediouro, Lúcia Jurema, da Nova Fronteira, a minha mãe mesmo, na editora Miguilim. Toda essa turma, de alguma maneira, é encantada pela obra da Sylvia.

revistapontocom – Em que medida Sylvia Orthof influenciou sua carreira?
Leo Cunha
– A minha obra, particularmente, foi muito influenciada pela Sylvia. Li muita coisa dela, em dezenas de livros antes de começar a ser escritor. Toda aquela alegria, carnaval, aquela ousadia que tinha, me marcaram. O meu primeiro texto foi publicado na revista Alegria, que era um desdobramento da então revista Recreio, nos anos 90. Foi a Sylvia que indicou meu nome. Se não fosse essa indicação, quando era totalmente desconhecido, talvez minha carreira não tivesse sido a mesma. Sylvia foi muito generosa. Ela abria as portas para muitos escritores e lia os textos da gente, comentava, indicava. Por todos esses motivos, sou eternamente grato.

revistapontocom – O que está por trás das obras de Sylvia Orthof?
Leo Cunha
– Uma grande busca pela liberdade, contra toda a forma de preconceito e autoritarismo. Vista como um todo, a obra dela é um grande manifesto divertido e criativo. Um manifesto carnavalesco a favor da liberdade e da ousadia e contra o autoritarismo. As principais obras dela refletem muito isso. Podemos citar: Mudanças no galinheiro mudam as coisas por inteiro; Uxa ora fada, ora bruxa; e Galo, galo, não me calo. Uma grande quantidade de obras que está aí na defesa da liberdade, do bom humor, do bem, em geral. É uma coleção muito importante que continua em cartaz. Continua nos catálogos de muitas editoras, embora alguns títulos tenham esgotado. Já vamos para quase 30 anos da morte dela e é claro que algumas obras acabam sendo esquecidas. Nesse sentido, acho importante estarmos sempre lembrando da sua enorme contribuição.

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Dilan Camargo
Dilan Camargo
5 meses atrás

O Leo Cunha é um dos melhores escritores de LIJ brasileira contemporânea. Sempre é muito bom ler os seus livros e também entrevistas como essa.

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