Sozinhas ou acompanhadas, as crianças assistem aos principais telejornais brasileiros. Diante deles, o público infantil tem acesso a uma variedade de informações, contextos e realidades nem sempre de fácil compreensão. Nos últimos dias, nem se fala. Os noticiários de TV – locais e nacionais – se dedicaram a cobrir a violência que tomou conta da cidade do Rio de Janeiro. Ônibus e carros incendiados. Carros de guerra. Policiais, militares, bandidos e população numa guerra urbana. Infelizmente, uma realidade vivida – ao vivo e a cores – por muitas crianças. Por outras, assistida pela tela da TV.
Trata-se de informação e não há como – nem poderia – censurá-la. Mas – se fosse possível – será que as crianças realmente precisariam acompanhar estas coberturas jornalísticas? Em que medida tamanha exposição favorece o entendimento dos fatos? Quais consequências isto pode gerar?
As perguntas não são tão fáceis de serem respondidas. Especialistas na área de Comunicação, Educação e Psicologia dizem que proibir o acesso não é a saída mais indicada. Afinal de contas, o que é apresentado faz parte do mundo em que as crianças vivem. Negar este acesso seria negar o conhecimento da própria realidade.
Realidade estampada nos telejornais que gera mal-estar, angústia e tristeza. Pelo menos foi o que constatou o Grupo de Pesquisa em Educação e Mídia (Grupem), da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio). Em setembro de 2004, o grupo veiculou um spot televisivo convidando crianças, com idades entre 8 e 12 anos, a enviar textos ou desenhos expressando sua opinião a respeito do que viam na tevê. O grupo recebeu cerca de 300 desenhos e 450 textos. A partir da análise de alguns desses materiais, o grupo pode traçar algumas considerações sobre as relações que as crianças estabeleciam com a tevê e, em especial, com os telejornais.
“Uma das questões mais evidenciadas nessa relação é o conflito que essas crianças vivenciam entre a necessidade de “saber o que está acontecendo” e o mal-estar que esse saber provoca nelas, pois a percepção de mundo que elas elaboram a partir dos telejornais parece ser, quase sempre, a de um lugar onde é impossível viver. Do que observamos até o momento, a representação da realidade veiculada pelos noticiários televisivos interfere na maneira pela qual as crianças elaborarem suas visões de mundo, provavelmente mais do que os desenhos animados que tanto preocupam professores, pais e especialistas”, destaca o artigo produzido por Rosália Duarte, Rita Migloria e João Alegria.
Embora reconheça a importância da informação para as crianças, é crucial destacar que o desenvolvimento infantil é intrinsecamente ligado ao lúdico, ao imaginativo, e não à factualidade do jornalismo. As crianças necessitam de um ambiente que estimule sua criatividade e fantasia, algo que os telejornais não proporcionam.
A exposição das crianças a notícias violentas e perturbadoras pode ter um impacto profundamente negativo em seu bem-estar emocional e mental. Os telejornais, frequentemente, não adaptam sua linguagem e conteúdo para o público infantil, o que pode gerar confusão, medo e ansiedade. Permitir que crianças assistam a esses programas sem filtro pode ser prejudicial ao seu desenvolvimento saudável.
Além disso, é crucial repensar as proibições às propagandas destinadas ao público infantil e o retorno dos programas infanto-juvenis. A publicidade voltada para crianças pode ser educativa e divertida, desde que sejam produzidas de forma ética e responsável. A presença desses programas na televisão proporciona um ambiente mais adequado e enriquecedor para as crianças, promovendo seu desenvolvimento cognitivo, social e emocional.
Nesse contexto, é fundamental estabelecer uma classificação indicativa específica para os telejornais, levando em consideração a sensibilidade e a capacidade de compreensão das crianças. Essa classificação ajudaria os pais a tomarem decisões mais conscientes sobre o que é apropriado para seus filhos assistirem.
Além disso, é imprescindível que os telejornais sejam acompanhados por orientações e discussões familiares que ajudem as crianças a contextualizarem as informações apresentadas e a lidarem com possíveis emoções negativas. Ignorar o impacto emocional das notícias sobre as crianças é negligenciar um aspecto crucial de seu desenvolvimento.
Portanto, é necessário encontrar um equilíbrio entre o acesso à informação e a proteção da saúde emocional e mental das crianças. Isso envolve não apenas a responsabilidade das emissoras de televisão em relação aos seus conteúdos, mas também a promoção de um ambiente enriquecedor e seguro para o desenvolvimento integral das crianças.
Rosalia Duarte,
Sou profesora universitária e tenho uma pesquisa publicada em livro sobre o tema Telejornalismo e Construção da Cidadania. A pesquisa foi feita com jovens e seus professores em escolas rurais do Vale do Paraíba. Eu também trabalhei com a produção de desenhos pelos jovens (pré-adolescentes), a partir da análise da audiência deles a telejornais e também com produção de textos e vídeos. Creio que podemos compartilhar idéias.
Gostaria de enviar para você um exemplar do meu livro que originalmente foi a minha tese de doutorado defendida na USP, em abril de 2003.
O email que enviei para seu endereço na PUC, voltou como desconhecido.
que a mídia não tem mostrado.
Seleciona apenas o que lhe interessa, e ignora, ridiculariza ou criminaliza o que não lhe interessa.
Sem fazer esta ressalva importante, fica difícil optar por mostrar ou ocultar das crianças a “realidade”.
A realidade é muito mais rica, múltipla, contraditória e plural do que mostra o nosso “jornal nacional”
Não dá para esconder a realidade em que vivemos – é correto.
Mas a mídia reflete esta realidade?
A espetacularização da violência, que leva à sua banalização; a seleção comentada do que deve e do que não deve “ir ao ar”, mostra uma seleção absolutamente parcial.
O mundo em que vivemos não é só feito de crimes e assaltos – prato preferido dos telejornais.
Há manifestações – culturais e de reivindicação – há temas em discussão na sociedade,