Da BBC
Durante a maior parte da sua juventude, Ed Cooke sempre esteve entre os dez melhores no ranking do Campeonato Mundial de Memória. Entre seus feitos, está memorizar 2.265 dígitos binários em meia hora e a ordem correta das cartas em 16 baralhos, em apenas uma hora. Mas, aos 26 anos, ele decidiu que queria ajudar pessoas a conseguir memorizar como ele. “As técnicas de memorização requerem uma certa disciplina. Eu queria criar uma ferramenta que permitisse aprendê-las enquanto se relaxa”, diz.
Em 2010, ele lançou o site e app Memrise, que já foi usado por 1,4 milhão de pessoas para aprender línguas estrangeiras, história e ciência. A tecnologia deu origem a outros semelhantes, usados tanto por indivíduos quanto por escolas. Cooke conta que nem imaginava o tanto que poderia ser criado a partir de sua ideia. “O app é muito poderoso. Ele faz toda a parte difícil de se aprender. Eu diria que, com ele, conseguimos cobrir um ano letivo de aprendizagem em apenas seis meses”, conta Dominic Traynor, professor de espanhol em uma escola primária em Londres.
Princípios
O app foi criado por Cooke com seu colega dos tempos da Universidade de Oxford, o neurocientista Greg Detre, que hoje leciona em na Universidade de Princeton, nos Estados Unidos.
O Memrise segue alguns princípios básicos. O primeiro deles é tentar associar um fato sem nenhuma relação ao que se quer memorizar. Se esses fatos tiverem algum elemento de comédia, eles são mais fáceis ainda de serem lembrados.
Por exemplo, ao aprender alemão, para se memorizar a palavra “Abend” (“noite”), um curso de línguas usava uma foto do ex-presidente americano Abraham Lincoln relaxando à noite, ouvindo música. A legenda da foto diz: “‘Abe’ sempre para de trabalhar à noite”. A charge cômica ajuda a remeter o apelido do ex-presidente (“Abe”) à palavra alemã “Abend”.
O que o app faz é programar esses testes várias vezes ao longo de dias, semanas e meses. Essa repetição no longo prazo é eficiente para ajudar a pessoa a memorizar. Testes repetidos também produziram resultados melhores do que métodos convencionais usados em livros – como o desenho de diagramas.
Outro princípio que o app explora é o de tentar fazer as pessoas se lembrarem de algo quando determinado assunto se encontra em um limbo entre o esquecido e o lembrado. Detre diz que é aquele momento em que uma resposta está “quase na ponta da língua”, mas o usuário não consegue se lembrar totalmente.
Nesses momentos, testar a memória das pessoas faz com que elas aprendam com maior eficiência. Os criadores do app conseguiram fazer um algoritmo que identifica este momento.
Diversão
Outro princípio importante é a diversão no processo de aprendizagem. “A experiência precisa ser algo leve, como ficar navegando em algum site como o Pinterest”, diz o diretor de operações da Memrise, Ben Whately. Para isso, foram criadas comunidades em que as pessoas podem “competir”, de forma amigável, para ver quem aprende mais.
Segundo o professor Traynor, foi esse elemento de competitividade que fez com que seus alunos se esforçassem mais para aprender espanhol.
“Assim que eles chegam à aula, eles querem ver o quadro de vencedores.”
O professor desenvolveu um método bom de usar o app em sala de aula. Ele separa seus alunos em dois grupos – metade fica usando o app nos iPads da escola; a outra metade tem aulas convencionais com ele. Depois de um tempo, os dois grupos alternam as tarefas.
O Memrise também foi usado em outras escolas para ajudar os alunos a aprender a soletrar. O próximo passo dos criadores do app é achar formas de medir o desempenho individual de cada aluno, para ajudar os professores a lidar com deficiências específicas de cada um.
Na esteira do sucesso do Memrise em vários colégios, outras empresas lançaram propostas semelhantes.
Um dos apps, o Cerego, foi lançado em setembro do ano passado e traz cursos específicos de memorização em assuntos como anatomia do cérebro, teoria musical e história da arte. A empresa diz que pessoas que usam o app tiveram desempenho de 20% a 50% superior em testes.
Os professores dizem que o princípio de diversão funciona bem, os alunos precisam trabalhar menos para aprender. Quem acaba precisando trabalhar são os próprios professores – já que os alunos começam a avançar muito rápido na matéria, e os tutores precisam preparar novas aulas.