Infância mais curta

Por Marcus Tavares 

O segmento de moda infantil ocupa uma fatia equivalente a 15% do mercado de vestuário no Brasil. Mercado de vestuário brasileiro: US$ 30,5 bilhões, infantil: US$ 4,5 bilhões. O faturamento do mercado de vestuário infantil no Brasil cresce cerca de 6% ao ano. Aproximadamente um bilhão de peças de vestuário infantil são produzidas anualmente. As confecções para meninas representam cerca de 70 % do total de peças vendidas. Dados da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção.

Pois é: o que era para ser uma coisa bem simples vem se tornando um tema polêmico. Explico: as roupas fabricadas aqui e lá fora, especialmente para as meninas, se inspiram, cada vez mais, na moda feminina adulta, carregada de sensualidade. Recentemente, algumas lojas de departamento, no Brasil, começaram, inclusive, a vender sutiãs para meninas de 10 anos com enchimento.

Há necessidade?

Assista ao vídeo da ABC (em inglês)

Assista ao vídeo da mostra infantil da Fendi italiana


A publicidade também colabora. Você já deve ter visto muitas propagandas trazendo crianças e jovens vestidos como adultos. Meninos de paletó e gravata e meninas de salto alto e maquiagem. Este último item nem se fala. Batom, brilho, lápis preto e blush fazem parte de qualquer bolsinha de menina. Acredite. Bolsinha que anda para tudo o que é lugar, até mesmo para a sala de aula. Em meio à explicação da professora, lá estão as meninas se olhando no espelho e retocando a maquiagem, sim, porque elas já vêm prontas de casa. A impressão que dá e que só não usam salto alto porque a escola proíbe.

Assista aos vídeos da menina americana Madison Hohrine que, com cinco anos, ensina outras crianças da mesma idade a se maquiar. A menina, inclusive, já ensinou no programa Fantástico, da TV Globo, como as crianças brasileiras deveriam se produzir para as festas juninas.

Práticas como essa só contribuem, infelizmente, para o encurtamento da infância. Talvez, alguns pais digam que estou exagerando, que tudo não passa de uma brincadeira infantil. Pintar o rosto, vestir roupas de adultos, imitar o estilo dos pais fazem parte da infância, do crescimento saudável de qualquer menino ou menina. Mas uma coisa é brincadeira. Outra, mais séria, é tornar a brincadeira hábito, padrão, norma.

As crianças não têm culpa. Os pais é que deveriam prestar mais atenção em suas ações e permissões. O mercado – de brinquedos ao vestuário – não está nem um pouco preocupado com regras, normas ou qualquer tipo de ética. Para ele, há muito tempo, as crianças são consumidoras em potencial, mesmo não tendo um real sequer no bolso. A senha para conseguirem o que querem é fácil: bater o pé, gritar, exigir e chorar. Como muitos pais acham que a palavra não irá frustrar seus filhos – infelizmente boa parte dos responsáveis ainda pensa assim – acabam cedendo. Resultado: uma infância cada vez mais curta. Pergunto: por que e para quê?

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Marinete D'Angelo
Marinete D'Angelo
13 anos atrás

Segundo o teólogo e escritor Leonardo Boff, “Todo ponto de vista é a vista de um ponto.” Isso me instiga a conhecer os diferentes pontos de vista dos envolvidos na questão. Afinal, o que esperam os pais? O que desejam os fabricantes? O que as crianças querem demonstrar? O que a mídia quer alcançar?
Nós, educadores, temos a responsabilidade de levar para a sala de aula essas discussões, ajudando o aluno a desenvolver a competência de analisar as intencionalidades por trás de toda ação ou discurso. Dessa forma, eles exercitarão o distanciamento crítico necessário para fazerem escolhas conscientes.

Marinete D’Angelo

Daniel Azulay
13 anos atrás

Há muito tempo, para ser preciso, desde 1976 quando comecei a apresentar programas de TV para crianças, venho fazendo um alerta sobre o assunto: me surpreendo com o abuso e a manipulação de interesses comerciais para estimular o consumo de produtos não adequados ao público infantil.

Desde a venda de brinquedos violentos como armas, videogames, músicas com danças carregadas de erotismo, (quem não lembra da “boquinha da garrafa”?) até o que se vê agora, baton, cosméticos faciais, e sutiãs com enchimento para crianças que usam salto alto aos 3 anos de idade! Não é à toa que muitas adolescentes estejam querendo colocar silicone para aumentar os seios e fazer plástica…!

Outras distorções são conhecidas: não é de hoje que a virgindade parece um estorvo, um incômodo que a menina quer se livrar para se tornar mulher mais cedo, mesmo que sua sexualidade não esteja pronta para isso. A Organização Mundial da Saúde alerta sobre os altíssimos índices de gravidez precoce aliada ao consumo de álcool, drogas e doenças sexualmente transmissíveis em todo o mundo.

É uma perspectiva obscura e sombria de um futuro que não queremos para nossas crianças, filhos e netos.

Que as tragédias de Columbine, do Realengo e de todas as crianças e jovens envolvidos em crimes cometidos sem explicação, possam explicar alguma coisa, que se chegue a uma razão definitiva para frear o abuso e exploração infantil!

Daniel Azulay

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