V Encontro Brasileiro de Educomunicação

Leia a entrevista com o professor e coordenador-geral do evento, Ismar Soares.

Por Marcus Tavares

O V Encontro Brasileiro de Educomunicação, realizado entre os dias 19 e 21 de setembro, reúne cerca de 130 especialistas e profissionais da área de educação e comunicação. O objetivo é discutir o tema Educação midiática e políticas públicas. De acordo com Ismar Soares, coordenador-geral, os debates “buscam identificar e valorizar os esforços do sistema público de ensino e da iniciativa privada no sentido de pautar a relação entre o universo educacional, formal e não formal, e o sistema midiático, em benefício do protagonismo do público consumidor, capaz de dialogar e construir suas próprias pautas de comunicação”.

saiba mais sobre o evento

Promovido pelo Núcleo de Comunicação e Educação da ECA/USP e pela recém-criada Associação Brasileira de Pesquisadores e Profissionais da Educomunicação e da Licenciatura em Educomunicação da ECA/USP, o encontro é composto por quatro mesas redondas, 20 painéis, sete grupos de relatos de experiências e mais quatro sessões de oficinas. Tudo documentado por crianças e adolescentes, como conta o professor Ismar Soares, em entrevista à revistapontocom..

Acompanhe a entrevista:

revistapontocom – Os encontros brasileiros de educomunicação têm se transformado, ano após ano, numa espécie de ágora, reunindo pesquisadores, especialistas e professores da área da mídia, da infância, da educação e de áreas afins. A que se deve tal movimento?
Ismar Soares – Entendo que a acolhida que os encontros de educomunicação vem recebendo por parte de especialistas e gestores públicos de áreas afins deve-se à própria natureza interdisciplinar do conceito. Seu foco é a interface comunicação/educação em toda a sua complexidade. No V Encontro, por exemplo, o tema da educação midiática, entendido como de interesse específico dos que, no espaço da educação, desenvolvem projetos ou pesquisas no âmbito da educação frente à mídia, é abordado por um grupo de 130 especialistas das mais diferentes áreas do saber, que vão do direito à política, da psicologia à sociologia crítica, da pedagogia por projetos à gestão comunicativa, passando pela mobilização comunitária em torno da construção de políticas públicas voltadas à mudança radical no modo de se conceber as relações de comunicação no interior dos sistemas educativos. É o que propõe por exemplo, o guia pedagógico do macrocampo “comunicação e uso de mídias”, proposto pelo MEC, no Programa Mais Educação.

revistapontocom – O senhor poderia traçar uma linha histórica temática dos encontros?
Ismar Soares – Falamos em sete anos, pois o I Encontro Brasileiro de Educomunicação ocorreu em maio de 2007, numa parceria entre o NCE da USP e o Grupo Estado, no contexto da publicação de uma página semanal no “Jornal da Tarde”, abordando temas do currículo do Ensino Fundamental a partir da perspectiva educomunicativa (80 dessas produções, de página inteira, foram veiculados aos domingos, entre 2006 e 2007).  Já o II Encontro  (agosto de 2010) visava apresentar ao público os primeiros cursos de graduação em Educomunicação aprovados por universidades brasileiras: a Licenciatura em Educomunicação da ECA/USP e o Bacharelado em Educomunicação da UFCG. O evento discutiu, entre outros temas, o perfil do profissional a ser formado. O III Encontro, ocorrido nos primeiros dias de dezembro de 2011, teve como tema “Uma década de Educomunicação”, fazendo alusão à consolidação do conceito ao longo dos primeiros dez anos do século XXI. O IV Encontro, em outubro, de 2012, centrou-se no tema: “Protagonismo sem Fronteiras”, analisando, com a presença de especialistas de todo o país, o reconhecimento que o conceito e sua prática haviam obtido na América Latina e mesmo na África (com destaque para Burkina Fasso e Guiné Bissau), por obra de organizações da sociedade civil e da universidade. Circulou neste evento a informação de que a CAPES havia registando a produção, no Brasil, de 85 pesquisas de mestrado e doutorado relativas à Educomunicação. Finalmente chegamos ao V Encontro que volta-se ao tema educação midiática – uma das práticas em que o educomunicador se envolve em seu cotidiano – buscando identificar e valorizar os esforços do sistema público de ensino e da iniciativa privada no sentido de pautar a relação entre o universo educacional, formal e não formal, e o sistema midiático, em benefício do protagonismo do público consumidor, convertido, mediante uma gestão compartilhada e democrática da novas mídias, em público socialmente capaz de dialogar e construir suas próprias pautas de comunicação.

revistapontocom – O V encontro consagra, então, um amadurecimento das discussões de educomunicação no Brasil?
Ismar Soares – Há 17 anos que o NCE/USP vem articulado pesquisa e extensão cultural, tendo promovido eventos anuais (congressos, simpósios e, finalmente, encontros nacionais) com a explícita intenção de oferecer espaços de diálogo entre as diferentes correntes de pensamento ou metodologias de ação em torno que denomina como “interface comunicação/educação”. No caso, os eventos se constituem em pista de mão dupla: difusão e acolhida de informações e experiências. Não restam dúvidas de que tais eventos contribuíram decisivamente para um amadurecimento das discussões sobre educomuncação. Em seu  livro Media Education, key concepts, perspectives, dificulties and main paradigms, o pesquisador indiano Devadoss Joseph Sagayaraj considera, por exemplo, que coube ao NCE/USP a realização de um dos quatro eventos mais importantes, em nível internacional, sobre o tema da educação midiática, na década de 1990. Referia-se ao Congresso Internacional sobre Comunicação e Educação, realizado em São Paulo, em maio de 1998, onde pela primeira vez se fazia uso do conceito da educomunicação para designar uma forma particular de se entender as relação comunicação e educação a partir não exatamente da educação (media education) ou da comunicação (comunicação educativa), mas de uma perspectiva singular engendrada no movimento social latino-americano que trazia para o cotidiano das comunidades a perspectiva do agir comunicativo como ação fundante do estar no mundo e do construir o mundo, segundo Paulo Freire. Nesse sentido, a cada novo encontro, novos pilares conceituais são explicados e novos atores são envolvidos nesse contínuo processo de construção teórica e metodológica.

revistapontocom – Qual o grande diferencial do evento deste ano?
Ismar Soares – Em 2013, estamos privilegiando o que denominamos como a “área da educação para a comunicação”. Chamamos para o debate os sujeitos sociais que estão no processo: a mídia, o sistema educacional público e privado, as organizações sociais, os pesquisadores, os protagonistas das ações, sem esquecer dos parceiros maiores desses processos que são os adolescente e jovens, incluindo um grupo de crianças da nação Guarani que produz rádio e vídeo na defesa de seu meio ambiente, nos sopés do Pico do Jaraguá, na periferia de São Paulo. Somamos, pois, a ação afirmativa dos promotores, o pensamento crítico dos pesquisadores e prática afirmativa das novas gerações. Durante o evento, um grupo de 50 adolescentes de diferentes procedências fará a cobertura educomunicativa, dialogando com as autoridades e os expositores.

revistapontocom – No atual contexto, e com todo o amadurecimento das discussões e pesquisas, como podemos definir o campo da educomunicação?
Ismar Soares – Definimos a educomunicação como um práxis social, na interface comunicação/educação, em permanente diálogo com os campos dos quais se origina. Em termos acadêmicos, como um paradigma orientador de ações coletivas na busca permanente da ampliação do coeficiente comunicativo das ações educativas, garantidor das condições para uma aprendizagem fundamental: aquela que dá legitimidade ao pleno exercício da expressão, independentemente dos condicionantes de idade, situação econômica, status social, entre de tantos outros elementos de exclusão. Em confronto com o funcionalismo hegemônico da comunicação comercial e com o iluminismo pouco disfarçado da educação tradicional, a educomunicação se coloca como um espaço articulador de ações voltadas a um diálogo comunicativo intransigente.

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