Por Zuenir Ventura
Jornalista
Numa de minhas viagens a Porto Alegre, me chamou a atenção a reportagem de um jornal: “A linguagem utilizada por jovens na internet já atrapalha alunos na hora de fazer provas e trabalhos escolares”. Professores reclamavam que até nos trabalhos manuscritos, não apenas nos digitados, está aparecendo um novo “idioma”, sem acentos, cheio de abreviações (tb, naum, vc), alternando maiúsculas e minúsculas dobradas (XxXHh) e com sinais gráficos como J, que quer dizer “feliz”.
Assim, nessa forma de escrever, o título daquela matéria seria grafado da seguinte maneira: “A LINGUaGi utiliZAdah por JovenxX Nah NeT jAh aTRAPalha aLUnux Nah hOrah di FaZe provAx i trabaAlhus escOLAREx”. Se você tem mais de 16 anos, experimente cantar esses versos: “mEU kOrAxxaUM NAUm sei pq/ BaTI feliz QDU Ti Ve”. Não sabe? Sabe, sim. Nas palavras de Pixinguinha isso quer dizer: “Meu coração, não sei por quê,/ bate feliz quando te vê”. Quer outro exemplo? “Ti dolu”. Esse já é muito usado: é o jeito infantilizado de dizer “te adoro”.
Fiquei sabendo também que o programador Aurélio Jarbas batizou essa ocorrência lingüistica pós-moderna de miguchês e criou uma ferramenta de tradução que em poucos dias teve mais de 10 mil acessos. Hoje são mil por dia. Segundo ele, há três opções: miguchês arcaico, moderno e o neo-miguchês, que é o nível mais radical, o dos exemplos lá do começo. “Não inventei nada, está tudo no Orkut”, garante em bom português.
Como Umberto Eco, sou otimista em relação à internet (embora ela já tivesse noticiado que eu morri, mas isso é outra história. Pelo jeito, a notícia não se confirmou).
Acreditamos que ela veio para salvar a palavra escrita, condenada à morte pela televisão, e para permitir pela primeira vez escrever “na mesma velocidade com que se pensa”, como se fosse a escritura automática dos surrealistas. O autor de “O nome da rosa” chega ao ponto de classificar o computador como “a civilização do alfabeto”.
Menos, Eco, menos, eu diria. Mas de qualquer maneira, nunca se escreveu tanto quanto hoje no mundo. Mesmo entre os pouco letrados é difícil encontrar quem não troque dezenas de e-mails por dia. O problema é o que está sendo feito com a ortografia. As palavras estão sendo estropiadas. “Ah, mas sempre foi assim”, dirão alguns, argumentando que a língua é um organismo vivo que se transformou ao longo da história – a exemplo do latim vulgar, que resultou no nosso Português, inclusive o da norma culta.
É verdade, sempre mudou, e muito, mas nunca em tal velocidade. Tah rapidu d+, vcs naum axam? Naum sei in q vai dar td ixXo.
Vcs naum axam?