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Terceirizando a leitura

Cresce a cada dia, com as facilidades da tecnologia, uma novidade na realidade de algumas crianças: os clubes de leitura infantil por assinatura. Os pais cadastram seus filhos para receber mensalmente livros pelos correios, com seleção e conselho de educadores. A grande imprensa vem divulgando tais serviços, como o Leiturinha, Booxs, Taba e Brinque-book.

Toda iniciativa que tenha o objetivo de promover a leitura é bem-vinda, é lógico. No entanto, alguns especialistas vêm com certo receio tal promoção. É o caso do professor José Nicolau Gregorin Filho, da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP, especializado em literatura infantil e juvenil.

Em entrevista ao jornal da Universidade de São Paulo (USP), ele diz que o serviço não é exatamente uma novidade nem exatamente positivo. “Como funciona o clube de leitura: você paga um valor mensal, quinzenal, e recebe um kit de livros, dependendo do valor, que eles (os responsáveis pelo serviço) escolhem, com os valores e temas que eles colocam para serem discutidos. Ou seja, é aquela ficha de leitura que a professora de antigamente passava na escola”, argumenta Gregorin.

Na entrevista, o professor pondera também sobre o fato de que todos os assinantes recebem os mesmos títulos, sem levar em conta suas preferências, seus contextos socioculturais, repetindo assim equívocos já questionados nas escolas. “Há condição de escolher um livro que seria legal que todas as crianças lessem, no Estado de São Paulo, no Brasil, independentemente de sua história de vida? Não seria cometer o mesmo erro que se comete ao colocar um único livro para 40 alunos numa sala de aula lerem? Isso não dá certo”.

A análise do professor também recai na terceirização que os pais acabam promovendo, quando a função deveria caber a eles. “Uma das ‘vantagens’ que esses clubes oferecem é a de receber em casa um livro, sem saber qual será, uma surpresa que estimularia a criança. Mas o pai pode muito bem ir à livraria e escolher um livro para o filho, de acordo com os valores que gostaria de transmitir. Então isso me parece uma nova terceirização da educação”.

Na visão de Gregorin, os clubes são, na prática, “mais um expediente do mercado para ganhar dinheiro”. Para o professor, seria muito mais produtivo discutir como a sociedade pensa a leitura literária hoje e, a partir daí, como deveríamos colocar a criança como leitor literário. “Hoje você tem todo um marketing que mostra que é legal estar o tempo todo com o celular, que é importante estar sempre conectado para entrar no mercado de trabalho. Mas não há o mesmo tipo de marketing incentivando o interesse pela leitura ou a importância da literatura na formação”.

O que é imprescindível para que a criança queira ler é o hábito. “Os filhos têm que se acostumar a ver seus pais lendo, a ver adultos lendo, do mesmo jeito que os veem mexendo no celular. Os modelos são importantes para o aprendizado, e a responsabilidade por essa educação é dos pais”.

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Samuel Alencar
7 anos atrás

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