‘Pontuo a necessidade de se criar um componente curricular exclusivo para tratar do combate e prevenção à violência escolar bem como do uso devido das tecnologias’

Cristina Pires Dias Lins – Mato Grosso do Sul
Professora aposentada – Escola Municipal Neil Fioravanti – Unidade CAIC
Mestra em Educação, na área de Políticas e Gestão da Educação pela Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD)

Estou recém aposentada. Mesmo assim fui muito impactada negativamente pelos tristes acontecimentos que vêm sendo noticiados na imprensa e nas redes sociais sobre os recentes casos de violência nas escolas.

Penso que quando se fala em educação, a primeira imagem que vem à mente, da maioria das pessoas, é a escola. Contudo, ressalto, que a educação é papel de todos: família, Estado, escola e sociedade como um todo, nesta ordem. Coloquei o Estado antes da escola porque é crível que o governo deve implementar, no mínimo, o básico para a sobrevivência das famílias com recursos que envolvem o saneamento básico, saúde, trabalho, segurança e a existência instituições educacionais.

No meu entendimento, existem vários procedimentos que poderão ser pensados a curto prazo e outros que deverão ser discutidos a longo prazo por meio de plebiscitos. Coloco em relevo que o ponto de partida deve se dar por meio de pesquisas. Numa avaliação mais geral dos fatos que vêm ocorrendo, é nítido que, ao longo do tempo, fora e dentro do Brasil, pelo menos quatro fatores se sobressaíram e culminaram nos ataques.

O primeiro é a ausência da família. Alguns dos praticantes dos atentados surpreenderam os seus familiares expondo a mensagem de que pais e ou responsáveis precisam estar mais atentas aos seus filhos, precisam conhecê-los, abrir um diálogo, ou seja, fazerem-se presentes tanto na vida familiar quanto no âmbito escolar e social.

O segundo é o bullying (cujo autores dos ataques são praticantes ou vítimas). Em seus antecedentes escolares, sofreram ou praticaram violências verbais, corporais, psicológicas, materiais, entre outros.

O terceiro é o uso indevido das tecnologias da informação e comunicação – TICs. Por meio de comunidades, as crianças e jovens estão expostos e ou propagam o ódio, o uso de armas, fake news, intolerâncias, preconceitos, sexismo, etarismo e, algumas vezes, estão até integrados a grupos que propagam o nazismo e o fascismo.

O quarto diz respeito a falta de investimento do Estado. Há despreparo de muitas escolas que estão sobrecarregadas com excesso de educandos em sala de aula, sofrem com a ausência da família, não possuem equipes multidisciplinares, como psicólogos e assistentes sociais. Não há amparo para a equipe escolar, o que é imprescindível.

Diante deste cenário, penso que a curto prazo as escolas poderiam reunir seus funcionários para integrar a comunidade escolar e dialogar sobre os últimos acontecimentos. Com a parceria multidisciplinar, deveriam procurar abraçar a comunidade que está amedrontada de modo que, juntos, assumam o compromisso de criar um projeto de combate e prevenção à violência escolar.

É preciso também ouvir os educandos, trabalhar com palestras de conscientização e prevenção, dispondo, inclusive, sobre aspectos jurídicos e penais. É preciso tratar também da afetividade, das atitudes e dos valores que estão sendo perdidos ao longo do tempo. Todas as ações devem ser amparadas pelas secretarias municipais e estaduais de educação.

Além de proporcionar verbas, é necessário que o Estado crie conselhos e concretize ações interministeriais, como já se tem pensado, e equipes para tratarem exclusivamente da violência escolar. Deverá promover formação continuada no tema e treinamentos para que as escolas saibam o que fazer diante de possíveis ataques. Todas as escolas deverão criar um protocolo de segurança reforçado.
Muito se falou em colocar “detectores de metais” na porta das escolas, o que desperta prós e contra. Por isso é importante abrir um diálogo nacional, estadual, municipal e na própria comunidade local de cada instituição escolar para que juntos possamos entrar num consenso. Mas, de imediato, mesmo que algumas escolas já possuam, creio que deveriam ser implementados dispositivos com botões de alerta em vários departamentos de cada unidade.

A longo prazo, é preciso realizar fóruns de discussões com famílias, escolas, secretarias, universidades, assim como plebiscitos para tomada de decisões. O Estado precisa investir para estreitar os laços entre o povo brasileiro e o assunto. Deve integrar a divulgação dos trabalhos que estão sendo realizados e promover “propagandas” que chamem atenção para a temática.

Mesmo que já existam apontamentos nas entrelinhas dos Temas Contemporâneos da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), pontuo a necessidade de se criar um componente curricular, exclusivo para tratar do combate e prevenção à violência escolar bem como do uso devido das tecnologias. Pois, assim, ficaria garantido na grade semanal que o tema seja trabalhado. Muitas vezes, mesmo que não sejam todos, há professores que se veem pressionados a cumprir o currículo, deixando de lado temas importantes, trabalhando de modo superficial.

É preciso trabalhar o letramento tecnológico (linguagem digital), literacia escolar e literacia familiar. Em suma, fica mais que comprovado que só teremos respostas para uma educação, que levante a bandeira da cultura da paz, a partir da união de todos. Comungo com a ideia de Paulo Freire: “ninguém educa ninguém, como tampouco ninguém se educa a si mesmo: os homens se educam em comunhão […]” (FREIRE, 1987, p. 79).

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