Da BBC Brasil
Ana Paula acaba de postar uma “selfie” clássica no Instagram: close no rosto, óculos escuros, sorrisão e dedos em riste com um “V de Vitória”. Resultado imediato: 101 curtidas e dezenas de comentários – “linda”, “diva”, “gata”, “musa”, “top”. Mas a boa repercussão não é fruto do ângulo escolhido em seu smartphone. A jovem está entre os milhões de brasileiros afeitos à autopromoção baseada em trocas nas redes sociais e acaba de aderir a uma novidade entre os usuários: a hashtag #trocoelogios.
A dinâmica é simples: Paula e seus amigos passam horas de seu dia comentando fotos de figuras populares, como Neymar, Valesca Popozuda e Mc Guimé. Por meio de hashtags, clamam por curtidas de outros usuários em suas publicações, prometem retribuí-las e, agora, também negociam frases positivas com quem elogia suas caras e bocas. A meta é acumular o maior número possível de interações positivas e “atestar” sua popularidade online.
O que isto significa? A alma do negócio nas redes sociais, dizem especialistas, chama-se “capital social”. O termo indica que a relevância digital de alguém será maior conforme a quantidade de curtidas e a qualidade dos comentários que ela arrecadar na internet.
É esta a corrida que leva Ana Paula e outros jovens a transformarem a visibilidade de seus ídolos em escada para a própria fama digital. Sempre de carona em perfis famosos, brasileiros já compartilharam mais de cinco milhões de vezes hashtags como #trocolikes e #sigodevolta só no Instagram.
Novidade, o escambo de adjetivos por meio da hashtag #trocoelogios vem rendendo variações curiosas, como #trocoelogiosinceros, #trocoelogiosnaultimafoto e #trocoelogiosnasduasultimas.
Fórmula fast food
Mutante a cada dia, o cardápio de estratégias para a multiplicação de fãs e curtidas lembra a fórmula “Peça pelo número” das redes de fastfood. São populares hashtags como #trocolikes10, #trocolikes20 e #trocolikes30: a numeralha indica o número de fotos que receberá curtidas caso o interlocutor cumpra o trato e retribua o “favor” da repercussão artificial de postagens.
“Peço elogios só para interagir com outros usuários do Instagram”, disse ao #SalaSocial a estudante Larissa, 16 anos, mais de 600 seguidores na rede – boa parte deles “negociada” por meio da sigla #SDV (ou “sigo de volta”). Larissa não vê problemas com a prática dos “elogios combinados”. “Eu gosto (de ver minhas fotos repercutindo). Acho normal.”
Recompensas
“Há estudos consolidados mostrando que a maneira como nós produzimos conteúdo nas redes sociais é regida por um sistema de recompensas”, explica Ana Freitas, especialista em tendências e comportamento em ambientes digitais. “Hoje posta-se assuntos pensando primeiro em popularidade e repercussão, e depois no conteúdo propriamente dito.”
Para Freitas, o fenômeno apenas reproduz no meio online aquilo que sempre aconteceu nas ruas, escolas ou encontros familiares. “As redes sociais são hoje um dos principais espaços de interação da molecada hoje em dia. A velha necessidade de ser aceito em diferentes grupos se mantém, só que agora no ambiente digital.”
Mas os “caça-likes” podem ser uma pedra no sapato para CEOs e executivos do Instagram, Facebook e Twitter. “Eles têm que quebrar a cabeça, né? Algoritmos existem para indicar quais conteúdos são mais importantes e quais são menos. Quando se subverte isso com pedidos de elogios ou likes, o algoritmo falha e dá visibilidade a tópicos que a princípio não mereceriam”, explica. “Daí a necessidade de uma ginástica para que estes serviços voltem a atribuir valor àquilo que circula por aí.”