Anualmente, o International Board on Books for Young People (IBBY) divulga uma mensagem para o dia 2 de abril, data de nascimento do escritor Hans Christian Andersen, quando se comemora o Dia Internacional do Livro Infantil. A cada celebração, um país membro do IBBY fica responsável por escolher uma dupla de escritor e ilustrador para a criação do texto e da imagem que compõem a mensagem, a Carta para as crianças do mundo. Para este ano, foram convidadas as irlandesas Siobhán Parkison (escritora) e Niamh Sharkey (ilustradoras), ambas residentes em Dublin,capital da Irlanda.
O texto de Siobhán, uma das escritoras mais famosas da Irlanda, trata da relação entre o escritor e o leitor, entrelaçados pela imaginação de cada um. Niamh é especializada em marketing e design.Confira, abaixo, o texto da Carta:
Carta para as crianças do mundo
Os leitores sempre perguntam aos escritores como é que eles escrevem suas histórias – de onde surgem as ideias? Da minha imaginação, responde o escritor. Ah, sim, poderiam dizer os leitores. Mas onde está a sua imaginação e do que ela é feita e todo mundo tem uma?
Bem, diz o escritor, ela está na minha cabeça, é claro; e ela é feita de imagens, palavras e memórias e vestígios de outras histórias e palavras, fragmentos de coisas e melodias, pensamentos e rostos, monstros e formas, palavras e movimentos, palavras, ondas e arabescos, paisagens e palavras, perfumes e sentimentos, cores e rimas e pequenos cliques, sibilos e gostos, explosões de energia e enigmas, brisa e palavras. E tudo fica lá dentro girando e cantando e caleidoscopiando e flutuando, e se moldando e sedimentando e coçando a cabeça.
É claro que todo mundo tem uma imaginação: caso contrário, não poderíamos sonhar. Porém, nem todas as imaginações têm as mesmas coisas dentro delas. A imaginação dos cozinheiros provavelmente só tem sabor dentro dela e a imaginação dos artistas tem principalmente cores e formas. A imaginação dos escritores, no entanto, é quase cheia de palavras.
A imaginação dos leitores e ouvintes de histórias também é movida por palavras. A imaginação do escritor dá cambalhotas e rodopia, dá forma as ideias, sons, vozes, personagens e eventos em uma história. E a história é feita só de palavras, batalhões de rabiscos manchados pelas páginas. Aí chega o leitor, e os rabiscos ganham vida. Eles ficam na página, ainda parecem batalhões de rabiscos, mas também estão brincando com a imaginação do leitor. O leitor está agora moldando as palavras giratórias, de modo que a história agora está dentro de sua cabeça, como já esteve na cabeça do escritor.
É por isso que o leitor é tão importante como o escritor para a história. Há apenas um escritor de cada história, mas há centenas, milhares ou talvez até milhões de escritores, na língua nativa do escritor ou talvez até mesmo em muitas línguas traduzidas. Sem o escritor, a história nunca teria nascido, mas sem todos os milhares de leitores em todo mundo, a história não viveria todas as vidas que pode viver.
Todo leitor de uma história tem algo em comum com todos os outros leitores dessa mesma história. Separadamente, e ainda de forma compartilhada, eles recriam a história do escritor em suas próprias imaginações: um ato que é ao mesmo tempo público e privado, íntimo e coletivo, nacional e internacional. Este ato pode muito bem ser aquele que os seres humanos fazem melhor. Continuem lendo.