Por Elena Mandarim
Do site da Faperj
No campo das discussões científicas sobre a Língua Portuguesa, os pesquisadores concordam que o ensino, tal como tem sido feito, principalmente nas escolas públicas, está muito longe de formar alunos com pleno domínio da norma culta, seja para expressão oral em situações específicas, seja para a escrita de textos mais formais. O que divide a opinião dos estudiosos, no entanto, é que uma parte deles acredita que o problema esteja em dar ênfase aos conceitos gramaticais, defendendo mais o uso da interpretação e produção de textos, enquanto outros apontam que as dificuldades são causadas por problemas da própria estrutura do ensino e não por ineficiência da gramática.
Fernando Vieira Peixoto Filho, professor de Língua Portuguesa no Departamento de Letras da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), é defensor convicto da necessidade do ensino de conceitos gramaticais. Ele coordena grupo de pesquisa que desenvolveu um projeto para avaliar o ensino de gramática na Baixada Fluminense (EGBF), que contou com auxílio da Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj).
Fernando e sua equipe entrevistaram, via questionários, cerca de 100 professores de Língua Portuguesa e 1.500 alunos, distribuídos em 15 escolas públicas nas cidades de Belford Roxo, Duque de Caxias, Nova Iguaçu e São João de Meriti. “Os resultados obtidos apontam a validade do ensino de gramática para garantir o acesso do grande público à norma padrão, mas também confirmam velhos problemas, como a baixa carga horária destinada ao professor de português, que muitas vezes tem de trabalhar em mais de uma escola, com obrigação de dar conta de conteúdos extensos, o que faz com que o ensino se torne ineficiente e superficial”, relata Peixoto Filho.
As respostas foram agrupadas em gráficos que mostram a visão tanto dos professores quanto dos alunos. Entre as análises, Peixoto Filho destaca que os dois grupos julgam necessário o ensino da gramática para aumentar as possibilidades de sucesso na vida profissional. “Fica claro que o aluno não pode mais sair da escola mantendo as velhas dificuldades na elaboração do texto escrito. Na vida real, se ele apresentar textos com erros de concordância, por exemplo, será discriminado tanto social quanto profissionalmente. É como se pudéssemos fazer uma associação entre o domínio da norma culta – que só é possível com o mínimo de gramática – e o grau de instrução e conhecimento”, afirma o pesquisador.
Outro dado interessante, segundo Peixoto Filho, é observar que a maior parte dos professores de português gerencia sua profissão de acordo com suas necessidades financeiras e sociais, e não por abraçar esta ou aquela ideologia pedagógica. Ele assinala que 95% dos docentes gostariam de trabalhar em apenas uma escola, mas 89% são obrigados a assumir várias turmas em mais de um emprego para conseguir uma renda mínima que atenda às suas necessidades. “Isso implica superficialidade no ensino e sacrifício de vários conteúdos específicos, o que não garante que o aluno saia da escola com os conhecimentos devidos”, explica o professor.
Peixoto Filho destaca que, diferentemente do que pensam muitos linguistas, não é porque a gramática é difícil que os alunos não aprendem ou não se interessam pela disciplina. Pelo contrário, cerca de 90% dos estudantes julgam necessário aprender conceitos gramaticais. Além disso, “grande parte dos problemas que aparecem na escola nasce fora dos muros escolares, principalmente na falta de estrutura familiar. Nesse sentido, talvez o ensino de gramática esteja servindo como uma espécie de bode expiatório para justificar um fracasso que não reside nas descrições ou prescrições gramaticais. Se faltam ao estudante as condições elementares nos planos afetivo e familiar, não se deve esperar que ele mostre serviço no plano intelectual. Os resultados assinalam que, para a maior parte dos professores, a falta de estrutura e apoio familiar representa o principal empecilho ao aprendizado de conteúdos gramaticais”, argumenta o pesquisador.
O professor adianta que a equipe do projeto EGBF já está trabalhando na redação do primeiro livro, que trará os resultados da pesquisa a partir da perspectiva discente. “A proposta é contribuir para que as políticas públicas e os futuros materiais didáticos estejam mais bem alicerçados nos aspectos relevantes no padrão escrito da gramática portuguesa, levando-se também em conta as reais necessidades de alunos e professores.”