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Filmes que deveriam ser vistos nas escolas

Plano Nacional do Cinema, em Portugal, vai exibir os 100 melhores filmes para os alunos.

Do Jornal Público PT

“Os Verdes Anos”, um filme de 1963 realizado por Paulo Rocha, o documentário Belarmino, que Fernando Lopes fez no ano seguinte, tendo-se tornado ambos bandeiras do Cinema Novo, e também “Recordações da Casa Amarela” (1989), de João César Monteiro, estão no topo da lista do cinema português que deve ser mostrado nas escolas, segundo a opinião de dez personalidades da cultura convidadas pelo PÚBLICO a escolher os dez filmes nacionais, e outros tantos do cinema mundial, que devem vir a integrar o Plano Nacional do Cinema (PNC).

No ranking do cinema estrangeiro, os dois filmes que colheram mais nomeações foram o clássico do neo-realismo italiano “Ladrões de Bicicletas” (1948), de Vittorio De Sica, e a comédia que o francês Jacques Tati realizou uma década depois, “O Meu Tio” (1958), na qual satiriza a vida moderna e urbana.

A criação de um PNC foi anunciada no início de março pelo secretário de Estado da Cultura, Francisco José Viegas, apontando para a sua entrada em vigor no ano letivo 2013/14. O objetivo de fazer entrar a arte e a história do cinema nos currículos escolares é também referido, de passagem, no projeto da nova Lei do Cinema, que a SEC tem atualmente em consulta pública.

Quando Viegas prometeu o novo PNC, numa visita a uma escola de Trás-os-Montes, associou-o ao modelo do já existente Plano Nacional de Leitura. E acrescentou que ele terá por base um catálogo de cem filmes, que, além da componente educativa – “os estudantes devem perceber que o cinema não começou há cinco anos, começou há cem”, disse Viegas, segundo o relato da Lusa -, servirá igualmente para formar novos espectadores.

O gabinete de comunicação da SEC explicitou depois ao PÚBLICO que o PNC irá resultar de um trabalho conjunto dos responsáveis da Cultura com o Ministério de Educação, a que se associará a Cinemateca Portuguesa, pois será do seu arquivo que sairão os filmes a disponibilizar às escolas. “O objetivo é criar uma filmoteca digital, com uma maioria de filmes portugueses, que seja acessível às escolas”, disse João Villalobos, assessor de Viegas, explicando que os filmes a seleccionar deverão ter conteúdos que “correspondam aos programas letivos e pedagógicos do ensino básico e secundário, entre o 7.º e o 12.º ano”.

Foi com base nesta carta de intenções que o PÚBLICO desafiou uma dezena de especialistas a propor o catálogo de filmes que consideram dever entrar nas salas de aula – algo que os professores já fazem hoje em dia, mas por iniciativa individual e de forma mais ou menos casuística. Das personalidades contactadas, aceitaram responder o ensaísta Eduardo Lourenço, o poeta e comissário do Plano Nacional de Leitura Fernando Pinto do Amaral, a atriz, realizadora e deputada independente Inês de Medeiros, o director do Museu de Serralves, João Fernandes, os realizadores João Salaviza e Jorge Silva Melo, o escritor Manuel António Pina, o arquiteto Nuno Portas, o crítico e ex-director da Cinemateca Pedro Mexia e a professora de Literatura Rosa Maria Martelo.

Houve várias pessoas que não quiseram responder, por razões diversas. Entre elas, a escritora e ex-ministra da Educação Isabel Alçada, que, contudo, deixou alguns alertas relativamente ao projecto. “Um plano não pode ser só uma lista, para além de que esta é sempre reducionista”, disse a ex-governante da equipa de José Sócrates. E reclamou “condições para que os professores possam escolher” os filmes a mostrar, além de referir que o catálogo deve ser organizado por “especialistas que conheçam os programas pedagógicos e educativos”.

A dificuldade de condensar mais de um século da história do cinema numa lista de apenas 20 títulos foi a objeção mais vezes referida pelos que aceitaram, apesar de tudo, fazer o seu catálogo. Eduardo Lourenço chegou mesmo a dizer que, com este limite, se via obrigado a “fazer uma guerra” contra filmes de que tanto gosta e que lhe parecem fundamentais para a escola. “Cheguei a ponderar escolher dez filmes do Chaplin”, gracejou o autor de Heterodoxia. Outros quiseram acompanhar as suas listas de pequenas notas justificativas (ver na edição online), que assumem o carácter subjetivo da escolha e a prioridade do gosto pessoal, que em alguns casos se terá sobreposto à preocupação pedagógica.

Mas voltemos aos filmes, e aos dois rankings apurados.

No cinema português, depois de “Os Verdes Anos” (com oito nomeações) e de “Belarmino e Recordações da Casa Amarela” (ambos com seis), surgem, também ex aequo (com quatro), duas longas-metragens de estreia: “Aniki-Bóbó” (1942), de Manoel de Oliveira, e “O Sangue” (1989), de Pedro Costa. Seguem-se (com três) a primeira-obra de Oliveira, o documentário Douro, “Faina Fluvial” (1931), “Uma Abelha na Chuva” (1972), com que Fernando Lopes adapta o romance homónimo de Carlos de Oliveira, “Brandos Costumes” (1975), de Alberto Seixas Santos, um retrato de Portugal nos anos do Estado Novo através das intrigas de uma família, “Conversa Acabada” (1981), de João Botelho, sobre a relação literária de Fernando Pessoa com Mário de Sá-Carneiro, e “Os Mutantes” (1998), de Teresa Villaverde, retrato de uma juventude inadaptada e à deriva.

Há depois mais 49 filmes, com duas e uma citações, que percorrem praticamente toda a história do cinema português, desde “A Canção de Lisboa” (1933), de Cottinelli Telmo, até ao recente “Sangue do Meu Sangue” (2011), de João Canijo. E, entre uma esmagadora maioria de longas-metragens de ficção, surgem também documentários, curtas e até um filme de animação, “Os Salteadores” (1993), de Abi Feijó.

Sem surpresa, o cineasta com mais filmes nomeados é Oliveira (16 citações para nove filmes). Seguem-se Fernando Lopes (10/3), Paulo Rocha (9/2) e João César Monteiro (9/4), João Botelho (7/4) e Pedro Costa (7/3), Teresa Villaverde (4/2) e, a completar os dez primeiros, Alberto Seixas Santos (3/1), José Fonseca e Costa (3/2) e João Canijo (3/3).

Dado curioso, mesmo que não inesperado, é a selecção de filmes portugueses privilegiar as produções dos anos 60, a década do Cinema Novo, e dos anos 80, sendo esta a década do boom e da afirmação internacional da cinematografia nacional, liderada pela dupla Oliveira e Paulo Branco (como produtor).

Mais filmes europeus

No cinema mundial, são os autores clássicos que dominam, e aqui, ao contrário do que se poderia esperar, com uma maioria de produções europeias: 47, contra 44 americanas e sete do resto do mundo. À cabeça, como vimos, está o filme-ícone do neo-realismo italiano, “Ladrões de Bicicletas”, ex aequo com a que será a obra mais conhecida de Tati, “O Meu Tio”, vencedor do Óscar de Melhor Filme Estrangeiro em 1959 (têm quatro nomeações cada). Seguem-se cinco filmes com três citações: “Tempos Modernos” (1936), de Charles Chaplin, “O Mundo a Seus Pés” (1941), de Orson Welles, “Sentimento” (1953), de Luchino Visconti, “A Sombra do Caçador” (1955), de Charles Laughton, e “A Palavra” (1955), de Carl Th. Dreyer. Ou seja, tudo obras realizadas nas décadas de 30 a 50 (sendo esta última a mais representada, ao inverso do que acontece com o cinema português, que não tem nenhum filme dos anos 50). Na lista dos filmes com duas citações há dez títulos, desde “Aurora” (1927), de F.W. Murnau, ainda no tempo do mudo, até ao incontornável “Apocalypse Now” (1979), de Francis Ford Coppola, sendo o mais recente dos referidos apenas uma vez “Rapsódia em Agosto” (1991), do japonês Akira Kurosawa.

Na lista dos realizadores, Charles Chaplin colhe o maior número de escolhas (seis, para três filmes), seguido, ex aequo, de Dreyer e Visconti (5/3). Quatro outros autores dos anos de ouro do cinema arrecadaram quatro citações: Hitchcock, Welles, De Sica e Tati. E com três há nove realizadores, que vêm do tempo do cinema mudo alemão e chegam até ao realizador iraniano contemporâneo Abbas Kiarostami. Ainda no ranking do cinema mundial – e aqui, ao contrário do português -, não há nenhum filme realizado nas duas últimas décadas, enquanto as anteriores vão subindo em representação conforme se recua no tempo até aos anos 50. A confirmar que alguma distância temporal pode ser determinante na consagração da arte do cinema.

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