Por Marcus Tavares
A poucos meses do início da pandemia do novo coronavírus, a Escola Sesc de Ensino Médio, localizada no Rio de Janeiro, abriu, em agosto de 2020, as inscrições para o Programa de Tutoria Educacional a Distância (PTED). A iniciativa oferecia 810 vagas, para o ano letivo 2021, para estudantes matriculados em unidades de ensino de todo país. A procura superou as expectativas. A coordenação recebeu 1092 inscritos.
Oficialmente, o programa foi lançado no dia 1º de março deste ano, com a presença dos estudantes, seus responsáveis e representantes das 27 regionais do Sesc. De acordo com o professor de filosofia e coordenador do projeto, Mateus Xavier, o mês de março está sendo dedicado à ambientação dos inscritos na plataforma criada para o projeto, aos encontros iniciais de tutoria e às avaliações diagnósticas e pesquisas para a elaboração do projeto de vida de cada estudante.
Durante os três anos do Ensino Médio, os participantes do PTED terão apoio nas disciplinas curriculares, por meio de videoaulas e outras estratégias de aprendizagem disponibilizadas na plataforma. Eles terão acompanhamento direto de educadores experientes. Além do suporte acadêmico, os jovens terão acesso à atividades culturais, apoio específico voltado ao ENEM, palestras motivacionais, educacionais e de orientação de carreira.
Em entrevista à revistapontocom, o professor Mateus Xavier explica que o PTED é mais um passo que a Escola Sesc de Ensino Médio trilha em busca de uma educação de qualidade para todos. Um passo e um desafio, “sobretudo porque as situações de acesso à internet não são favoráveis aos processos de educação a distância no nosso país. Nem todos os jovens possuem conexão e equipamentos adequados para tirar o melhor proveito dessas experiências. Por isso, estamos trabalhando fortemente para construir parcerias que minimizem esses desafios, contando, inclusive, com toda a rede Sesc, espalhada em todo Brasil. Essa iniciativa é uma luz que o Polo Educacional Sesc acende e que pode suscitar experiências semelhantes que façam alguma diferença na vida de jovens brasileiros matriculados no Ensino Médio”, destaca.
Acompanhe a entrevista concedida à revistapontocom
revistapontocom – Qual é o objetivo do programa?
Mateus Xavier – O objetivo é acompanhar, de forma totalmente gratuita e em modalidade remota (online), centenas de jovens em todo o país. Durante os três anos do Ensino Médio, os participantes do PTED, vinculados às suas escolas de origem, terão apoio nas disciplinas curriculares, por meio de videoaulas e outras estratégias de aprendizagem disponibilizadas em uma plataforma digital completa e com acompanhamento direto de um corpo de educadores experientes e apaixonados. Os jovens no PTED, além do suporte acadêmico, têm à sua disposição acompanhamento tutorial com profissionais especializados, acesso a atividades culturais, apoio específico voltado ao ENEM, palestras motivacionais, educacionais e de orientação de carreira. São estudantes de todo o Brasil, o que reafirma nosso compromisso social com aqueles que buscam a educação e o conhecimento como formas de traçar novos caminhos, superando as desigualdades e entendendo-se como agentes de transformação. O novo Programa é mais uma afirmação de nosso compromisso incontornável com a juventude brasileira, sobretudo com os jovens em situação de maior fragilidade educacional, à luz do conceito de Justiça Social. Esse compromisso está presente em cada ação executada na Escola Sesc de Ensino Médio e faz parte das reflexões diárias de todo o corpo técnico da instituição, sempre com o intuito de reduzir as dessemelhanças e ampliar as oportunidades em um país tão desigual.
revistapontocom – Como o programa funciona na prática? Qual a metodologia que será aplicada? Quem serão os tutores?
Mateus Xavier – Cada estudante do PTED acessa as atividades dentro de sua rotina, procurando estratégias próprias e adequadas a partir de suas realidades e construindo de maneira autônoma, mas com orientações, um percurso individual, realizando a curadoria das atividades de maior interesse para seu itinerário de educação complementar e reforço. A partir das dificuldades acadêmicas encontradas na escola de origem, o estudante acessa, no contra turno, a plataforma digital de conteúdos. Se ainda persistirem dúvidas, ele as envia aos professores pelo fórum assíncrono. Se preferir resolvê-las sincronamente, basta escolher o melhor o turno e horário mais adequado. Do ponto de vista do acompanhamento tutorial, o estudante se encontra sincronamente uma vez por semana com o grupo, composto por até 35 pessoas, e com o professor tutor. Neste espaço, trata das questões relativas ao processo de elaboração do projeto de vida, da organização, da metodologia de estudos e da preparação para as atividades de fruição cultural. Os professores que atuarão no PTED são os mesmos que conduzem os processos de aprendizagem presencial na Escola Sesc de Ensino Médio. Trata-se de um time de profissionais altamente capacitado e atualizado. Cerca de 80% dos professores envolvidos têm Mestrado e Doutorado, mas para nós essa especial e valiosa formação dos docentes é tão importante quanto o fato de que esses educadores amam a educação e colocam o coração em todas as atividades que realizam. Titulação sem compromisso social e afetivo pode ser um tanto estéril. Na Escola Sesc passamos longe dessa armadilha. Todos os professores têm coração de educador. Não há uma metodologia única que alicerça o projeto. Temos, contudo, a certeza de que todos os jovens atendidos serão sempre considerados protagonistas de suas histórias e, portanto, a proposta pedagógica precisa mobilizar esse protagonismo a partir de metodologias ativas de aprendizagem, através das quais busca-se uma abordagem de cada área do conhecimento plena de sentido e de contextualização. Ainda que o PTED se caracterize por atendimento a distância, trabalhamos para encurtar esse distanciamento, a partir de um acompanhamento que vise à proximidade e os diálogos. A Escola Sesc de Ensino Médio compreende que as experiências de aprendizagem mais sólidas só ocorrem quando os sujeitos envolvidos – educadores e educandos – relacionam-se positiva e produtivamente, a partir de situações de conhecimento, reconhecimento e afeto.
revistapontocom – Trata-se, portanto, de uma tutoria mais individualizada, mais próxima?
Mateus Xavier – Para quem conhece a educação a distância praticada nos cursos de graduação e pós-graduação sabe que, em geral, há um tutor para um grupo de mais ou menos 100 estudantes, podendo variar de 70 chegar a 300. No ensino médio presencial esse número gira em torno de 40 estudantes. No PTED, cada tutor acompanha um grupo de 35 jovens, pelos três anos do ensino médio. Isto possibilita um atendimento personalizado e individualizado, porque há um encontro semanal com o grupo e ainda um fórum semanal assíncrono por meio do qual o estudante é provocado a elaborar o projeto de vida, a seguir as orientações acadêmicas e a se organizar para os estudos. Ou seja, por trás da plataforma há a pessoa do tutor e, do outro lado, a pessoa do estudante. Ambos, numa relação de parceria, se encontram regularmente para superar os desafios que se apresentarem no caminho, sempre movidos pela acolhida e afeto que marcam o processo educativo do Polo Educacional Sesc.
revistapontocom – Já é possível traçar um perfil dos inscritos? O que este ‘mapeamento’ indica para os gestores do programa?
Mateus Xavier – Em relação aos dados colhidos até o momento, temos alguns dados preliminares. Do ponto de vista demográfico, temos o seguinte quadro: 54,6% do Sudeste, 16,7% do Nordeste, 11,7% do Norte, 8,5% do Sul e 7,8% do Centro-Oeste. Com relação ao gênero, 60,5% para o feminino e 39,5% para o masculino. 76,9% dos estudantes conciliam os estudos com outras atividades como trabalho, atividades domésticas e outros afazeres. Com relação ao perfil digital, 92,5% dos estudantes possuem smartphone pessoal. 89,8% acessam a internet por ele. Essa conexão é razoável para 44,9%; excelente para 15,2%, mínima para 17,1% e conexão para garantida 22,6%. Com relação ao ensino no contexto da pandemia em 2020, 79,6% estudaram por meio de plataformas, 7,4% por meio de apostilas, 1% por livros, 5% disseram não ter tido acesso aos conteúdos. 6,6% indicaram outros recursos. 68,7% tiveram atividades em todas as matérias. 31% não tiveram aulas em todas as disciplinas no 9º ano. Neste momento, para compreendermos o verdadeiro impacto na aprendizagem dos estudantes do programa, iniciamos as avaliações diagnósticas em todas as áreas do conhecimento. Elas servirão de bússola para o início do planejamento. Estes poucos dados já nos indicam alguns caminhos importantes. Como o acesso à internet se dá pelo celular, é importante que os materiais didáticos, sobretudo os que se utilizam de multimídias, devem ser curtos, mesmo que tenham que ser estrategicamente partidos. Em segundo lugar, por se tratar de um programa nacional, consideramos a realidade de cada estado e região, não só do ponto de vista acadêmico, mas também das necessidades relativas à construção do projeto de vida, como também oferecer formação empreendedora aos jovens e suas famílias que foram mais afetados economicamente pela pandemia. Pedagogicamente, somos desafiados a pensar itinerários diversificados para atender às diferentes expectativas. 73% estão no programa para buscar reforço nas disciplinas mais complexas e 73% desejam reforçar a preparação para o Enem. Isso implica oferecermos diferentes trilhas para diferentes públicos.
revistapontocom – Essa adequação do programa às diferentes realidades dos estados e dos estudantes/escolas é um grande desafio…
Mateus Xavier – Estamos iniciando agora o momento de aproximação e diálogo com as sedes regionais do Sesc dos quais procedem os estudantes no sentido de construir parcerias para o acesso à programação das unidades locais, bem como o uso dos espaços da biblioteca e dos diferentes projetos do Sesc, como o Sesc Ciências e o Sesc Ler. No que diz respeito aos currículos regionais considerados para efeito de acesso ao ensino superior. Como alguns programas consideram também conteúdos locais, já começamos a vislumbrar possíveis articulações que contemplem tais necessidades. Também, na linha das demandas que começam a ser mapeadas, percebemos a necessidade de desenvolver pequenos projetos de geração de renda e de economia criativa para atender as necessidades mais prementes dos estudantes e suas famílias.
revistapontocom – Qual será a rotina dos estudantes inscritos?
Mateus Xavier – Da parte do Programa, a única exigência é que o estudante frequente os encontros semanais síncronos de tutoria, porque entendemos que ele é ponto de partida e de chegada de todo o sucesso do estudante. Ou seja, como o estudante está em processo de formação de sua autonomia, ele precisa de orientação de um educador experimente. No mais, caberá ao estudante, no contraturno escolar, verificar suas necessidades e acessar a plataforma digital de conteúdos para atendê-las. O programa não define um número mínimo de horas diárias para acesso à plataforma ou aos encontros síncronos. Os estudantes, orientados pelos responsáveis e tutores, vão desenhando seus próprios itinerários.
revistapontocom – Os estudantes serão avaliados de alguma forma?
Mateus Xavier – Não buscaremos processos avaliativos dessas aprendizagens, embora toda estratégia de ensino contemple uma dimensão de verificação do aprendido. Nosso propósito, contudo, é oferecer alavancas e sonhos, ajudando os jovens a construírem pontes para um amanhã mais feliz e de maior realização. Os jovens receberão declarações de participação, mas – por se tratar de um programa de tutoria com suporte à educação complementar – toda certificação do segmento de ensino é conferida pela escola de origem. Como não há vínculo formal entre o estudante e a escola que oferece o programa, não há nenhuma forma de avaliação nos moldes tradicionais. O nosso desejo, como programa de formação complementar ao ensino médio, é que o estudante, ao frequentá-lo, reverbere positivamente em termos de conhecimento em sua escola de origem, ampliando sua capacidade de aprendizagem e desenvolvimento humano. Porém, após acessar e assistir as aulas e videoaulas disponibilizadas na plataforma, o estudante, se desejar, poderá fazer pequenas verificações de aprendizagem que lhe oferecerá feedback imediato. Porém, o valor gerado tem apenas efeito simbólico para que o estudante se situe em relação ao seu processo de aprendizagem e se reposicione com orientação do tutor. E também que o professor reveja a proposição das estratégias para o aprendizado.
revistapontocom – E as escolas e as famílias dos estudantes: elas participam de alguma forma também do projeto?
Mateus Xavier – Somente a experiência vai nos dizer da necessidade de algum contato direto com as escolas dos estudantes. De todo modo, há uma relação indireta na medida em que o programa oferece suporte acadêmico a partir daquilo que é ensinado em cada instituição na qual o estudante está matriculado. Delas procedem os temas e assuntos e desafios que fazem com que os estudantes nos acessem para reforçá-los ou complementá-los ou ampliá-los. O sucesso do projeto está vinculado diretamente ao nível de participação das famílias. São elas que acompanham de perto o nível de envolvimento de seus filhos com a educação complementar. Neste sentido, os pais terão acesso mensal aos relatórios de participação dos filhos na plataforma. Há previsão de que nas reuniões trimestrais se faça consultas e pesquisas de satisfação com todos os envolvidos para que ao longo do caminho possamos corrigir as rotas.