Entrevista com Jim Lengel

“A disponibilidade de informação e comunicação enriquece o relacionamento entre aluno e professor, mas somente se ambos aproveitarem as vantagens e aprenderem a utilizar os recursos tecnológicos para fins acadêmicos sérios”. A declaração é de Jim Lengel, consultor e professor da Universidade de Nova York especialista em Educação 3.0, que participou da abertura do evento Inova Educa 3.0, realizado no dia 1o de outubro, em São Paulo.

Confira os principais trechos da entrevista concedida à assessoria do evento:

Como o senhor define a Educação 3.0? Qual a diferença dela para a educação tradicional?
Jim Lengel – A Educação 3.0 tem como princípio preparar os alunos para o mundo de hoje e de amanhã, para que estejam prontos para atuar em universidades e empresas que exigem pessoas inteligentes e curiosas, capazes de descobrir as coisas por si mesmas e aptas a tirar o máximo partido das tecnologias de informação e comunicação. A Educação 2.0 – que a maioria das escolas de todo o mundo está praticando atualmente – foi projetada para preparar os alunos para um local de trabalho industrial e uma mentalidade que não existe mais. As principais diferenças são visíveis na sala de aula e nas mentes dos alunos. Na Educação 2.0, os alunos sentam em grandes grupos e todos fazem a mesma coisa, ao mesmo tempo. Na Educação 3.0, os alunos trabalham em muitos grupos diferentes, cada um fazendo uma coisa distinta, contribuindo para o sucesso do trabalho do grupo. A Educação 2.0 mede o sucesso pelo “domínio de um conjunto restrito de rotinas e tarefas cognitivas que foram importantes para o trabalho industrial, nas  fábricas. A Educação 3.0 mede o sucesso dos alunos pela curiosidade, coragem, personalidade e capacidade de colaborar em pequenos grupos para resolver problemas complexos.

Qual o papel do professor, na Educação 3.0? 
Jim Lengel – O professor não é mais simplesmente um transmissor de conhecimento e guardião da ordem como na Educação 2.0. Na Educação 3.0, os professores desenham e gerenciam um complexo conjunto de projetos, estudantes e atividades que mudam frequentemente. Trabalha em estreita colaboração com outros professores e profissionais da universidade e do mercado de trabalho para garantir que o projeto dos alunos seja apontado para direção certa.

Somente o acesso às tecnologias mais modernas possibilita colocar em prática a Educação 3.0? Ou é preciso ainda uma transformação na postura de quem ensina e de quem aprende?
Jim Lengel – Desde que a tecnologia da informação em rede mudou o local de trabalho e a universidade e tornou-se um componente essencial para o mundo moderno, devemos preparar os alunos para esta nova realidade. Isso significa uma mudança na maneira de ensinar, nos materiais que utilizamos e nas formas que aprendemos. Livros de papel, folhas de papel e lápis e as outras tecnologias da Educação 1.0 e 2.0 devem dar lugar às tecnologias muito mais eficientes e interessantes que o mundo já está usando em outras áreas.

Quais habilidades são mais desenvolvidas na Educação 3.0?
Jim Lengel –
A Educação 3.0 desenvolve as competências necessárias para o mundo moderno de pesquisa e trabalho: curiosidade, pensamento rápido, busca de ideias, trabalhar em um grupo colaborativo, integrar ideias de várias disciplinas, e uma compreensão das ideias principais que explicam a condição humana e o progresso.

Como a Educação 3.0 pode impactar a educação no Brasil?
Jim Lengel – Muitas escolas no Brasil já praticam os princípios da Educação 3.0, buscando um alinhamento com as necessidades dos locais de trabalho e preparando os alunos para o futuro do Brasil. Mas muitas escolas seguem um modelo europeu ou americano industrial de escolaridade, que pode ter sido útil há 50 anos, mas é, hoje, irrelevante para os tipos de cidadãos que o Brasil precisa formar para avançar. Cada escola no Brasil precisa repensar e redefinir o tipo de cidadão que quer produzir – e então redesenhar a escola para desenvolver esses tipos de pessoas.

O Brasil está preparado para esta revolução educacional? O senhor poderia dar um exemplo?
Jim Lengel – O Brasil já está evoluindo do ponto de vista educacional. O país está fazendo grandes investimentos na educação, desenvolvendo novas capacidades, especialmente no Ensino Médio e universitário, para preparar seus cidadãos para uma economia moderna e uma democracia participativa. Grupos educativos, tais como o SENAI em Santa Catarina, estão projetando novas escolas em torno dos princípios da Educação 3.0, bem como programas de formação de professores no Estado de São Paulo estão preparando educadores com habilidades importantes no ensino e aprendizado digital.

Como as novas tecnologias estão transformando as relações entre professores e alunos?
Jim Lengel – As novas tecnologias digitais trouxeram aos professores novos canais para interagir e ensinar seus alunos por meio de diversas ferramentas, como as apresentações multimídia, os podcasts, a troca de mensagens online, os fóruns virtuais e a publicação e o compartilhamento de arquivos em multimídia. As tecnologias dão aos estudantes acesso não apenas às ideias e informações produzidas por seus professores, mas à bibliotecas on-line repletas de material acadêmico, alguns dos quais seus professores nunca tiveram acesso. A rede também oferece mais canais para que possam estabelecer debates com seus professores e colegas. A disponibilidade de informação e comunicação enriquece o relacionamento entre aluno e professor, mas somente se ambos aproveitarem as vantagens e aprenderem a utilizar os recursos tecnológicos para fins acadêmicos sérios.

Qual será o impacto dessas novas tecnologias nas escolas, nas salas de aula?
Jim Lengel – Se for empregada para tirar sua melhor vantagem, a tecnologia digital deixa a sala de aula mais viva, instigante, rica e profunda. O professor apresenta uma ideia ilustrada por imagens, som, voz e música; os alunos acompanham a aula em seus dispositivos móveis, com links para conteúdos referenciados, estimulando que façam perguntas mais profundas e discutam temas complexos com seus pares. E, após a aula, a aprendizagem continua: os estudantes pesquisam e criam suas próprias soluções e apresentações, muitas vezes junto com um grupo de estudo virtual. E muito do que é apresentado hoje na sala de aula, como a dissertação e exposição dos conteúdos pelo professor, será acessado em casa ou no ônibus pelos estudantes, reservando-se o tempo de aula para lidar com os pontos difíceis.

Como o senhor imagina que uma sala de aula será daqui a 5 ou 10 anos? 
Jim Lengel – As escolas que funcionam na Educação 3.0 inventaram espaços de aprendizagem muito diferentes das salas de aula típicas de hoje. Em vez de 30 cadeiras, um quadro negro e a mesa do professor, estas escolas realizam suas atividades escolares em uma variedade de configurações: uma sala de aula grande com recursos de multimídia, uma sala de reunião pequena com uma dúzia de pessoas ao redor de uma mesa, uma sala com mesas redondas onde 4 ou 5 estudantes trabalham em um problema em conjunto, uma biblioteca com poucos livros, mas muitas cadeiras confortáveis ??e bibliotecários preparados para ajudar nas novas formas de pesquisa online. Não apenas o espaço físico, mas haverá mudanças no cronograma também, com horários alternativos e mais independentes.

Que dicas o senhor daria para os professores?
Jim Lengel – Em primeiro lugar, aprendam a utilizar as novas tecnologias. Todos os dias, para tudo que puderem, assim como seus alunos fazem. Em segundo lugar, empreguem a tecnologia no ensino onde seja apropriado e incentivem seus alunos a usar a tecnologia para seus trabalhos escolares. Em terceiro lugar, modifiquem suas metodologias de ensino tirando proveito do que as tecnologias oferecem para facilitar a aprendizagem. Os principais desafios para avançar na Educação 3.0 são a tradição e a falta de visão. Você precisa impor uma visão convincente do que uma escola deve ser, a fim de superar a influência do “jeito que costumava ser.” Na escola 3.0, o aluno raramente entrega seus trabalhos em papel. Em vez disso, mantém um portfólio online, uma coleção de trabalhos que fornecem evidências de aprendizagem para os professores e pode ser usado posteriormente para a admissão para a faculdade ou entrevista de emprego. Na educação 3.0, o aluno é o foco dos esforços educativos e eles sabem que serão recompensados pela descoberta de novos padrões e relacionamentos.

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