Por Rita Abundancia
Do El Pais
Os gurus do Vale do Silício, os cérebros por trás da Apple, Google, Yahoo e Hewlett Packard, aqueles que inundam o mundo com novos softwares e aplicativos, enviam seus filhos a escolas onde o material escolar pareceria mais compatível com uma comunidade Amish, conhecidos pelas restrições aos eletrônicos, do que com o maior laboratório tecnológico de ideias do mundo. Os mesmos desenvolvedores que concebem tablets, jogos interativos e programas de computador para crianças escolhem para os seus rebentos escolas que apostam em metodologias de ensino inovadoras. Não por causa da tecnologia empregada em sala de aula, mas sim pela filosofia de aprendizagem.
A Escola Waldorf da Península, na Califórnia, é um dos estabelecimentos que mais recebem os filhos da tecnologia, com uma pedagogia que aposta na experimentação do mundo real e na ênfase em fomentar a criatividade, a curiosidade e as habilidades artísticas inatas dos pequenos. A Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) sugere num relatório global que os sistemas educacionais que investiram muito em computadores registraram pouca melhora em seus resultados de leitura, matemática e ciências no Programa Internacional de Avaliação de Alunos (PISA). Por conta disso, os melhores sistemas educacionais foram muito precavidos na hora de usar a tecnologia nas salas de aula.
Beverly Amico, líder da associação das escolas Waldorf da América do Norte, acredita que as escolas realmente inovadoras “ensinam aos alunos as novas formas de pensar que muitos empresários procuram”, conforme declarou em matéria do The Guardian sobre o assunto. Habilidades como tomar decisões, criatividade e concentração são muito mais importantes do que saber manipular um iPad ou preencher uma planilha do Excel. Os empresários do Vale do Silício sabem, afinal, que a tecnologia que utilizamos hoje se tornará obsoleta no mundo de amanhã. Priorizar metodologias inovadoras, e não somente infraestrutura tecnológica de ponta, portanto, é mais estratégico em sala de aula.
Na Europa, a Espanha encabeça os índices de fracasso e evasão escolar, que são conceitos distintos. Os últimos dados da Pesquisa de População Ativa, correspondentes a 2015, apontavam uma ligeira redução, de seis pontos percentuais, no índice de evasão escolar precoce – algo que os especialistas atribuem ao desemprego, já que a falta de trabalho motiva a continuar estudando. Ainda assim, a Espanha ainda dobra a média europeia nesses quesitos. Essa e outras razões levam muitos pais a reavaliar a educação dos seus filhos e a optarem por escolas alternativas, com propostas e currículos heterodoxos, que fogem da uniformidade, dos livros didáticos tradicionais e da divisão dos alunos por idades.
O crescimento das pedagogias alternativas
Almudena García, mãe e programadora de software em Girona (Catalunha), é a criadora do site Ludus, um diretório de pedagogias alternativas que surgiu há quase dois anos. García substituiu a impessoal creche por um grupo de criação, no qual mães e filhos compartilhavam um espaço de brincadeiras livres, e agora se dedica a escolher o colégio que sua filha frequentará depois de completar seis anos. “A economia é o que marca a educação”, comenta García. “A escola tradicional, que ainda temos, nasce com a época industrial, na qual havia uma demanda por indivíduos homogêneos, com uma cultura e preparação muito similares e aptos a cumprir ordens sem questionar demais; com aulas nas quais o professor era o único protagonista, baseadas em livros-texto e na capacidade de memorizar determinados conteúdos. A pedagogia alternativa propõe justamente o contrário, um trabalho apoiado em projetos nos quais a criança é a autora do seu próprio aprendizado.”
Algo que quase todos os profissionais da educação concordam é a urgência de reformar o sistema educativo em escala global. Estela d’Angelo é psicóloga e pedagoga, além de professora no departamento de didática e organização escolar da Faculdade de Educação da Universidade Complutense de Madri. D’Angelo avalia que “o sistema se recusa a mudar e obriga os alunos a se adaptarem a ele, quando o desejável seria o contrário”. De um modo geral, as críticas da especialista são focadas em uma melhor e nova formação dos professores; na necessidade de abrir espaço à diversidade no sistema de ensino, criando outros ambientes de aprendizagem. “Aprende-se na interação, e isso já é aceito em todo o mundo. No entanto, as salas de aula ainda olham para a frente, o professor é o eixo central e trabalha-se muito pouco em equipe.”
Segundo Estela, os espaços falam por si mesmos quando, analisadas de fora, as escolas se assemelham a prisões de segurança máxima. “Na Finlândia, nação sempre usada como referência do ideal educacional, as escolas se parecem muito com as casas, com lugares comuns, que lembram pequenas salinhas, ou cozinhas onde os alunos recolhem e organizam as coisas. Aqui há um controle excessivo, áreas de segurança, que torna as crianças muito dependentes. Mas, às vezes, é um controle sobre coisas sem importância ou mais arbitrárias, enquanto depois ocorrem casos de assédio que não tiveram a atenção necessária.”
Por tudo isso, D’Angelo compreende a opção de muitos pais pela educação alternativa, mas também destaca um risco em algumas dessas escolas, “o fato de criar situações ideais e contextos nos quais o aluno é sempre levado em conta, respeitado e onde seus gostos são sempre aceitos. Às vezes, alguns centros funcionam como estufas, que isolam as crianças do mundo exterior e lhes proporcionam um ecossistema ideal, mas a vida real não é assim, e pode ser que, quando saiam, tenham um grande choque”, pondera a pedagoga.