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Resenha de livro

O show do eu - a intimidade como espetáculo. Por Nilza Alves.

Por Nilza Alves

Hoje, a crescente exposição da vida íntima e privada nos diversos meios de comunicação e a forte presença da imagem na relação que os indivíduos estabelecem com o mundo, com o outro e consigo apontam para uma subjetividade radicalmente próxima do olhar do outro e inserida num regime de visibilidade onde as tecnologias de informação e de comunicação têm um papel fundamental.

“Como alguém se torna o que é?” Para responder a pergunta central de Nietzsche no ápice de uma cultura onde a intimidade é o espetáculo, a pesquisadora argentina Paula Sibilia, graduada em antropologia e comunicação – atualmente professora do curso de Estudos Culturais e Mídia da Universidade Federal Fluminense – dedicou-se a pesquisar as novas práticas autobiográficas, ou “confessionais”, de exposição pública da vida privada na Internet. Em O show do eu – a intimidade como espetáculo (Editora Nova Fronteira), livro originado de sua tese de doutorado na Escola de Comunicação da UFRJ, Sibilia analisa uma forma específica de se conectar, ou seja, a escrita de si, autobiografia que se torna digital, instantânea e multimídia, da qual o Orkut, o MySpace, o Facebook e os blogs são alguns dos exemplos mais visíveis.

Neste livro, a autora nos mostra de que maneira cresceu o interesse da sociedade do espetáculo pela privacidade de famosos e pessoas comuns, através de veículos como biografias, blogs na internet e reality shows na televisão,

Mas qual a origem desse novo fenômeno? A tese central do livro aponta que a passagem do século XX para o XXI foi marcada por um deslocamento do eixo central que alicerça a experiência de si, implicando fortes mutações nas formas com que nos construímos como sujeitos. Assim, em vez daquelas subjetividades tipicamente modernas, pacientemente elaboradas no silêncio e na solidão do espaço privado (um tipo de caráter introdirigido), proliferariam de maneira crescente as personalidades alterdirigidas, voltadas não mais para “dentro de si”, mas para “fora”, visando à captação dos olhares alheios em um mundo saturado de estímulos visuais.

Ao longo de nove capítulos sobre as diferentes dimensões do “eu” na internet – o eu narrador, o eu privado, o eu visível, o eu atual, o eu autor, o eu real, o eu personagem e o eu espetacular – a autora alinhava experiências de subjetividade nas quais as dimensões “íntimas” e “confessionais” são pensadas como “alterdirigidas”.

Neste aguçado e fluido ensaio, Sibilia traça diálogos entre os grandes pensadores contemporâneos da individualidade, como Nietzsche, Freud, Foucault, Certeau, Marx, Benjamin, Debord, Deleuze, Lejeune, McLuhan, Eco, Bergson etc. Também vozes de “celebridades instantâneas”, como Bruna Surfistinha e Cleber Bambam encontram espaço aí, indicando que não só a maneira como vemos o mundo e como este nos vê está mudando, mas também a forma como enxergamos a nós mesmos. Afinal, o que leva alguém a querer expor todos os detalhes da sua vida, se em outras épocas lutava-se por preservar a própria privacidade de toda intromissão alheia? Que estratégias são utilizadas para atrair os olhares? O que há de tão atraente na vida privada de uma pessoa para despertar a curiosidade de outra que nem mesmo a conhece? E, principalmente, o que torna alguns mais interessantes do que outros, num momento em que cresce a impressão de que a maioria tem tão pouco a dizer ? De onde vem essa necessidade constante de tornar pública nossa intimidade, de tornar nebulosa a fronteira da privacidade, enfim, de mostrar ao mundo como, o que, quando, onde e por que estamos vivendo?

Sob uma perspectiva histórica, Sibilia contextualiza o novo momento e analisa a origem dessa necessidade de publicização do “eu”. É certo que os sujeitos e suas produções revelam um ser e estar no mundo. Assim, Sibilia mostra como esta nova subjetividade se dá no ato de se fazer visível e de expor a intimidade na busca da aprovação alheia. Com essa pesquisa, aponta que essas novas práticas resultam signi?cativas. Após a leitura, somos levados a concluir que, por trás dos panos, “O show do eu” contemporâneo ainda tem muito a revelar.

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Nilza Alves  é Mestre em Educação (UFF) e graduada em Comunicação Social e História (UFF). Pesquisadora do Observatório Jovem (Educação/UFF)

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