Por Marcus Tavares
O bullying e o cyberbullying já fazem parte da rotina das escolas. E não é de hoje. Muitas instituições vêm apostando em campanhas de conscientização junto às crianças e jovens para tentar inibir as ações dos estudantes, como é o caso da rede de escolas da Prefeitura do Rio de Janeiro. Em alguns contextos, funciona. Em outros, envolvendo inclusive colégios particulares, não. Há casos em que o problema acaba na delegacia.
Foi a relação que crianças e jovens estabelecem hoje com as mídias que levou a professora do Colégio Pedro II, Andrea Müller Garcez, a estudar o fenômeno. Em abril deste ano, ela defendeu a tese de doutorado, Representações sociais do cyberbullying na mídia e na escola, no Departamento de Pós-Graduação em Educação da PUC-Rio.
Andrea entrevistou 13 gestores (diretores e ou coordenadores pedagógicos) de 10 escolas municipais do Rio de Janeiro. Antes, porém, fez um estudo da representação social do cyberbullying na mídia. Ela analisou 128 matérias veiculadas em jornais, revistas, rádios e TVs. “A ideia era observar também como a imprensa trata o tema. A mídia responsabiliza a escola e a considera omissa em relação ao cyberbullying. Os gestores, por sua vez, atribuem à família maior responsabilidade e a veem como falha na educação dos filhos. Para eles, o principal papel da escola é, ou deveria ser, o de transmitir conhecimento, e não educar”, destaca.
Acompanhe a entrevista:
revistapontocom – Como podemos definir o que é bullying e cyberbuylling?
Andrea Müller Garcez – Bullying, de acordo com Olweus, o pesquisador norueguês que cunhou o conceito na década de 1970, são agressões (físicas ou verbais) repetidas e intencionais executadas por um estudante ou por um grupo deles e dirigidas a um estudante que, sozinho, não se sente em condições de se defender. Ou seja, de acordo com a formulação inicial do conceito alguns critérios são utilizados para diferenciar o bullying de outros tipos de violência na/da escola: acontecer entre pares, em uma relação desigual de poder, ser intencional e repetido (não um fato isolado). Cyberbullying tem sido definido como bullying que acontece por meio da internet, ainda que, ao ser transportado para esse meio, o fenômeno adquira certas especificidades. No entanto, tanto o conceito de bullying quanto o de cyberbullying tem sido utilizados de forma mais ampla, não levando em consideração esses critérios.
revistapontocom – Como as escolas vêm trabalhando, lidando com este tema?
Andrea Müller Garcez – Em minha pesquisa de doutorado, entrevistei 13 gestores de escolas municipais do Rio de Janeiro. Em geral, a escola trabalha o tema com projetos, teatro, vídeo, conscientizando os alunos. A Secretaria Municipal de Educação do Rio distribui material e incentiva esse trabalho. No entanto, o bullying está relacionado a questões mais profundas em nossa sociedade, como o preconceito, o racismo, o machismo, a intolerância religiosa, a homofobia. Essas questões precisam ser discutidas seriamente na escola. É preciso se fazer um trabalho de educação moral, que ultrapasse o nível da conscientização e das lições de moral. E isso não será possível enquanto a escola continuar se vendo apenas como transmissora de conhecimento e considerar o papel de educar prioritariamente da família. Precisamos discutir o papel da escola na sociedade antes de discutir o seu papel nas questões relativas ao bullying e ao cyberbullying. Interessante observar que os meios de comunicação atribuem à escola a principal responsabilidade sobre o combate e prevenção do bullying e ou cyberbullying. Para a imprensa, a escola é omissa. Já os gestores apontam as famílias como negligentes e as responsabilizam, não apenas pelo bullying/cyberbullying, mas por todo tipo de dificuldade enfrentada pela escola. Precisamos discutir também o papel dos diretores. Em todas as escolas em que estive, os encontrei muito atarefados e envolvidos em tarefas burocráticas. Algumas escolas não tinham coordenador pedagógico e não existe mais na rede de escolas do município do Rio a figura do orientador educacional. O diretor tem que dar conta de uma infinidade de problemas na escola e a gestão dos conflitos interpessoais – não apenas o bullying ou cyberbullying – acaba ficando em segundo plano. Por conta disso, eles só agem na urgência, quando os conflitos já atingiram grandes proporções.
revistapontocom – Na visão dos gestores, o bullying e cyberbullying são um problema?
Andrea Müller Garcez – Para os gestores, bullying é um problema, mas o cyberbullying ainda não. Segundo os entrevistados isso não está acontecendo entre os alunos das suas escolas, ou, quando aconteceu, foi de forma esporádica e pontual. É curioso, já que todos eles relataram que os alunos estão cada vez mais conectados, usam a internet nos seus celulares, embora haja coibição do uso na escola, já que é proibido por lei. Ao que tudo indica, na visão dos gestores, o bullying fica restrito ao ambiente offline, embora eles tenham descrito a relação dos jovens com a internet como intensa e até patológica. Resta saber se para os pais e para as crianças está sendo um problema, ou não.
revistapontocom – Você falou sobre a atuação da imprensa. Ao divulgar casos de bullying/cyberbullying, a mídia ajuda ou atrapalha na resolução/combate do tema?
Andrea Müller Garcez – Na maioria das vezes, a grande mídia trata o tema de forma simplista e exagerada, criando um “pânico moral”, por exemplo, quando os casos de suicídio são divulgados apontando-se exclusivamente o cyberbullying como motivador. Além disso, os meios de comunicação contribuem para que o bullying seja visto como um problema “natural” das crianças e adolescentes, tratando-o como algo da esfera individual e descolando-o da discussão mais ampla sobre a violência na/da escola e a violência na sociedade. Por outro lado, eles contribuem para a difusão das informações. Hoje esses conceitos fazem parte do nosso vocabulário e, ainda que com diferenças, esse tipo de agressão passou a ser recriminado pela sociedade.
revistapontocom – É alto o índice de bullying/cyberbullying no Brasil?
Andrea Müller Garcez – O problema das estatísticas sobre cyberbullying está na definição do fenômeno. Não há consenso e por isso os números são muito discrepantes. Segundo a pesquisa TIC Kids Online Brasil 2012, 22% das crianças brasileiras relataram ter sofrido algum tipo de situação que as aborreceu, incomodou ou chateou, no ano precedente à pesquisa (online ou offline). Dessas crianças, 47% afirmaram ter sofrido aborrecimentos pela internet.
revistapontocom – Os casos vêm aumentando?
Andrea Müller Garcez – Não temos dados para dizer se o número de casos aumentou, se aumentou apenas a nossa percepção sobre eles, ou ainda se as duas coisas aumentaram. O fato é que, embora o fenômeno seja muito antigo, quando o nomeamos, ele passou a existir de forma diferente. O nome é muito mais do que uma etiqueta que colamos sobre algo que já existia, ele passa a constituir o fenômeno.
Olá pessoal,
Sou mestre em educação e trabalho o cyberbullying. Gostaria de contribuir com essa revista enviando um artigo para publicação, que aborda o tema.
Obrigada,
Sônia Araújo – Ms. em Educação.