Por Marcus Tavares
O menino vive buscando justificativas para fugir da escola. Um dial, ele encontra o motivo perfeito: a garota mais bela que ele já viu. Mas ela mora em um circo e ele não tem dinheiro para entrar. O menino embarca na grade aventura de crescer. Esta é a sinopse do curta Sonhos, de Haroldo Borges, que ganhou o Prêmio de Melhor Filme do júri da Mostra de Cinema Infantil de Florianópolis deste ano.
Rodado no sertão da Bahia, o filme fez sua estreia na própria Mostra. Para o diretor Haroldo Borges, o prêmio é o reconhecimento do trabalho de toda uma equipe, de uma produção baiana, de uma produção nordestina. “E isso representa muito”, comemora.
Por e-mail, o diretor concedeu uma entrevista à revistapontocom, revelando um pouco mais sobre a produção do curta, de sua carreira e da tarefa de produzir no Brasil audiovisual para o público infantil.
Acompanhe:
revistapontocom – Foi o seu primeiro trabalho audiovisual com crianças e sobre crianças? Como você chegou ao projeto?
Haroldo Borges – Somos um coletivo de realizadores, a Plano 3 Filmes, e nos apaixona contar histórias onde a criança seja a protagonista. Já realizamos outros filmes para esse público, todos eles com carreira em festivais e difusão em escolas da rede pública, cineclubes e pontos de cultura, entre eles “Meninos” que foi o único sul-americano que participou do Pangea Day, evento transmitido dos estúdios da Sony para todos os continentes. Teve ainda o “Piruetas”, que integra o Programa Curta Criança, do Minc/TV Brasil, bem como o “Pequeno”, que também está rodando muitos festivais agora, entre eles o festival infantil Divercine no Uruguai, o Festival de Cinema Infanti (FICI), no Brasil, e o Festival de Cine para Ninos y no tan Ninos, no México.
revistapontocom – Como foi o processo de produção do curta Sonhos?
Haroldo Borges – “Sonhos” foi contemplado pelo Fundo de Cultura do Estado da Bahia. Filmamos todo o projeto em um pequeno povoado no sertão da Bahia, chamado Quicé. O filme foi rodado em sete dias. O protagonista é vivido pelo ator Jonas Laborda, que tem uma história muito particular: ele é palhaço. Sua família é toda de circo. Seu pai é palhaço, seu avo é palhaço. Sua história é tão curiosa que estamos desenvolvendo um documentário sobre sua vida “Jonas e o circo sem lona”. O ator que vive o pai de Jonas, no curta, é Cícero, também palhaço. E o circo que aparece no filme é na realidade o circo onde Cícero vive. Quem dá vida ao personagem da garota é Uerla Cardoso, uma atriz encantadora, que em breve estará em muitos filmes por aí. E tem também o AC Costa, um ator baiano já consagrado nacionalmente.
revistapontocom – De onde surgiu essa história? Quem escreveu o roteiro?
Haroldo Borges – A escrita do roteiro foi compartilhada com Paula Gomes, que é produtora do filme. A história surgiu de uma longa pesquisa que realizamos em 2006, onde visitamos 35 circos itinerantes, para realizar um primeiro curta que tinha o circo no centro da história. De lá pra cá, nos aprofundamos no tema. Dessa experiência surgiram muitas histórias para contar.
revistapontocom – Como é gravar com crianças e sobre crianças?
Haroldo Borges – É sempre um aprendizado e muito enriquecedor para ambos os lados. A criança mantém os nossos sonhos de infância vivos, além de sempre aportar algo que é muito particular do seu universo na proposta do filme. Às vezes é uma brincadeira ou uma forma de falar muito regional. Poder aproveitar essa espontaneidade dá uma verdade ao filme que é muito bonita.
revistapontocom – A sua direção quis enfatizar o quê da história?
Haroldo Borges – A própria história! O trabalho da direção é fazer todos os elementos funcionarem em conjunto a serviço da história.
revistapontocom – O curta Sonhos representa o quê pra você?
Haroldo Borges – O sentido da vida!!!! (risos) O cinema faz parte de mim. Fazer cinema é contar histórias. O filme traz a vida, o maravilhoso e o fantástico muitas vezes escondem o terrível e o desesperador. É preciso estar atento e preparado para aprender com todas as experiências.
revistapontocom – Produzir cinema no Brasil …
Haroldo Borges – É uma grande aventura. O cinema digital salvou minha vida! Antes, no tempo do negativo, fazer cinema era impossível e agora, com o digital, é muito difícil, progredimos muito não? (risos). Temos hoje também a lei da obrigatoriedade de conteúdos: um outro ponto importante.
revistapontocom – E produzir cinema no Brasil com temática infantil…
Haroldo Borges – É necessário. É muito importante a realização de obras representativas da nossa cultura, da nossa identidade, para que nossas crianças se reconheçam e não nos enlatados em que são empurradas a consumir. Minha infância foi vivida nos anos 80. Assistia a todas as aventuras dos super-heróis dos Estados Unidos. Não existe nenhum problema em assistir à produção estrangeira, mas como existia apenas isso minhas memórias e lembranças hoje estão relacionadas com uma cultura estrangeira. Mas algo anda muito mal quando uma geração ou duas ou até três trazem suas lembranças mais afetivas relacionadas às culturas estrangeiras.
revistapontocom – Neste sentido, o que vem por aí? Mais filmes com e sobre crianças?
Haroldo Borges – Vem ai “Jonas e o Circo sem Lona”, vivido pelo nosso protagonista de o Sonhos. Trata-se do nosso longa-documentário que esse ano apresentamos um primeiro corte do filme no DocsBarcelona e no ano passado esteve no DocBuenosAires e no DocMontevideo. Com um personagem infanto-juvenil muito carismático, estamos apostando no seu êxito com esse público. Aguardem.