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Cinema infantil: em cartaz há doze anos

Os bastidores da Mostra de Cinema Infantil de Florianópolis. Conheça Luiza Lins, idealizadora e coordenadora do projeto.

Por Marcus Tavares

Conheci Luiza Lins, coordenadora da Mostra de Cinema Infantil de Florianópolis, em 2004, no Rio de Janeiro, por ocasião da realização da 4ª Cúpula Mundial de Mídia para Crianças e Adolescentes. Uma pessoa vibrante e que estava disposta a criar pontes e redes para promover a mostra de cinema infantil em Florianópolis, já na terceira edição. Sua empreitada tinha um só objetivo: oferecer às crianças, inclusive seus filhos, produção audiovisual brasileira infantil.

Hoje, ela faz questão de avisar que o caminho não foi fácil e ainda não é. Mas quem conhece o projeto reconhece que ele cresceu, sendo capaz de levar cinema infantil para as famílias de dentro e de fora da ilha, transformando-se numa verdadeira política pública de defesa e promoção do cinema infantil nacional.

No terceiro dia de mostra deste ano, no saguão do hotel, onde estavam hospedados parte do júri oficial, ela conversou comigo. Passados nove anos, a mesma pessoa vibrante estava lá. Mais madura. Com certeza, mais consciente de seu papel. Mas não menos entusiasmada e sensível. Logo no início da entrevista, ao citar o homenageado da mostra deste ano – o poeta brasileiro vivo Manoel de Barros – seus olhos enchem de água. “A inspiração dele me comove”, diz sorrindo.

Silêncio.

Em seguida, pergunto a ela como é produzir a mostra durante doze anos. O sorriso desaparece. Tendo que a cada nova edição provar a importância do projeto, muitas vezes para os mesmos dirigentes de órgãos públicos, com o objetivo de levantar recursos para a realização do festival, confessa que a burocracia cansa.

Não reivindica privilégios, mas não entende como alguns setores do poder público ainda não se deram conta da proposta e de seu impacto. O custo de realizá-la, se comparado com outros eventos culturais brasileiros, é baixo. Irrisório, diriam alguns, dado a capilaridade do projeto. “Com R$ 600 mil já consigo realizar a mostra”, diz, completando que boa parte do recurso é investida no transporte das crianças das escolas públicas para o cinema.

Os números impressionam: são cerca de 17 dias de evento, onde centenas de milhares de crianças vão ao cinema (no ano passado foram 140 mil) assistir aos curtas e longas infantis nacionais (na bagagem já passaram na tela cerca de 550 obras). Na programação, há ainda encontros com especialistas e gestores públicos dos municípios vizinhos, no qual incentiva a realização de mostras regionais, com a distribuição gratuita dos curtas. Dos 293 municípios de Santa Catarina, 140 foram atendidos na edição de 2012.

No meio da entrevista, o celular de Luiza toca. Pede desculpas e atende como se fosse alguém da equipe de produção da mostra. Fornece todas as informações da programação da tarde de domingo. Explica que o preço do ingresso, nos finais de semana, custa R$ 2,00, o que inclui pipoca, sorteio e o direito de votar no filme que mais gostou. “O número do meu celular está no site da mostra. Acho que é muito importante atender ao telefone, ter esse contato com o público. Temos que ser educados. Precisamos ser educados”, explica.

Não é por falta de profissionais que Luiza atende. Sua equipe, durante a mostra, é composta por 50 pessoas. Curioso que boa parte não está ali por acaso. São jovens profissionais da área de comunicação. Há doutorandos, pesquisadores e produtores que também focam o seu trabalho na área da infância. Mas, na prática, a equipe é muito maior. Luiza conta com uma rede de amigos. Que o diga Naiara, amiga de longa data e professora de português da rede municipal de ensino de Florianópolis. Naiara é vizinha de Luiza. “Muro com muro. Se algo acontece na recepção das escolas, fico sabendo. Ela é um ótimo termômetro para saber como andam as coisas. Para quem é detalhista como eu… nada me escapa”.

Parece que não mesmo. Além de realizar a mostra ao longo dos doze anos, Luiza se lançou também na produção de curtas infantis. “Talvez, com medo de não ter filmes infantis para a mostra. Talvez, como iniciativa de dar o exemplo”, explica. Por um ou outro motivo, Luiza acaba de lançar o terceiro filme – O sumiço da coroa – de uma trilogia que resgata a história da comunidade da Lagoa da Conceição, um dos bairros da ilha. “Sou um pouco idealista”, conta. Um pouco? Além da mostra, dos curtas, Luiza envolveu-se com associações e fóruns de cinema pelo Brasil. Participa sempre de outros encontros nacionais e internacionais, buscando novidades para o seu evento.

O celular toca novamente. E a cena se repete. Dessa vez, ela explica como se chega ao teatro, local de exibição dos filmes. Lembra novamente do valor do ingresso e justifica: “de segunda a sexta, é gratuito, quando as exibições dos filmes são reservadas aos estudantes: 500, na parte da manhã, 500, à tarde. 500 vêm da escola pública. Os demais da escola particular”. Desliga. “Mas por que é cobrado o ingresso?”, pergunto.

Não titubeia: “uma forma de valorizar a produção nacional, o cinema para as crianças. Se for de graça, as pessoas acabam não valorizando”.  E avisa que o passaporte de R$ 2 está congelado há anos. O dinheiro arrecadado é para as despesas de rotina da mostra. Ela conta que na única vez que estabeleceu parceria com uma empresa comercial teve que ter voz ativa e pé firme para não aceitar a contrapartida exigida: a exibição do comercial do produto que ia de encontro aos valores de defesa e proteção da infância. Na ocasião, foi ameaçada de perder a cota de patrocínio. Não se intimidou e bancou a sua decisão: não exibiu o comercial. Acabou que a empresa honrou o compromisso. Sorte de ambos. Mas depois dessa, Luiza não quis correr novo risco/desgaste. Nada de patrocínios e ou apoios comerciais.

Com 12 anos nas costas, diz que está na hora de estabelecer limites na jornada. Torce para que surjam outras Luizas “idealizadoras e que sejam persistentes”. Sinal de quem está prestes a aposentar? De jeito algum. Tem a sensação de que, mesmo “velhinha”, estará  sempre à frente da mostra, mas deseja que a proposta frutifique cada vez mais.

O telefone toca pela terceira vez.
De um lado, as mesmas perguntas.
Do outro, a mesma simpatia.
E olha que ainda faltam 14 dias para a mostra terminar.

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