Por Lais Fontenelle
Psicóloga do Instituto Alana
Todo final de Novembro quando as luzes e as decorações das cidades e suas casas nos anunciam que o Natal se aproxima fico pensando no real significado dessa data, a segunda que mais gera lucro aos lojistas, perdendo somente em vendas para o dia das mães. Será que estamos comemorando o Natal com nossas famílias de forma sustentável? Será que temos passado valores humanos para nossas crianças ao comemorar um Natal onde o presente é o mais importante da festa? Gostaria de compartilhar aqui essa reflexão para que nós adultos, que temos a capacidade de transformar a forma como temos celebrado essa data junto com nossos pequenos, possamos repensar o real sentido que temos dado ao Natal.
Na minha família toda vez que nascia um novo neto minha avó de quem herdei não somente os profundos olhos, mas, também o nome bordava um saco de papai Noel com o nome do novo bebê que havia nascido. Esse parecia ser um ritual de boas vindas da família, da qual guardo belas recordações, que se reunia toda noite de 24 de Dezembro não somente para trocar presentes, que preenchiam os sacos bordados a mão pela vovó, mas para celebrar conquistas e afetos compartilhados ao longo daquele último ano. Não posso negar que a troca de presentes sempre fez parte dessa festa, mas a magia envolvida na celebração era, sem dúvida, muito mais importante e interessante, para nós crianças, do que os presentes em si.
Esperávamos na janela do quarto pelo trenó do bom velhinho enquanto os adultos arrumavam os sacos embaixo da árvore. E mesmo aquelas netas mais velhas ou mais céticas como eu, que não acreditavam no Papai Noel respeitavam os outros e quando aparecia algo mais brilhante no céu diziam: “Lá vem ele!” e assim corríamos para sala para abertura coletiva dos presentes. Uma verdadeira farra. Hoje me parece que os presentes são o que mais importam nessa data religiosa e comemorativa que parece também ter sido mercantilizada, infelizmente. Atualmente as famosas cartinhas de Natal entre as crianças trazem listas sem fim dos últimos lançamentos de brinquedos anunciados incessantemente pela publicidade na tv -que convida nossos filhos a um consumo exagerado. Esse ano parece que o hit de pedidos foi o Ipad mesmo para crianças bem pequenas.
O trânsito na cidade, a excitação para ver as decorações e a imposição da compra de um número quase sem fim de presentes seja para familiares, amigos secretos ou conhecidos sempre me incomodou muito sem contar o desperdício de comida e o lixo de embalagens gerado no dia seguinte das comemorações. Mas, acredito que a saída para reversão desse tipo de celebração, nada sustentável, também se encontra na poesia das crianças que conseguem, através de uma mediação bem conduzida e com diálogo aberto por um adulto, endereçar como pedido de Natal na suas cartinhas algo como paz, borboletas, alegria e muito mais coisas poéticas do que materiais como vi em alguns murais de escolas. Mas, isso requer muito diálogo entre adultos e crianças senão, sem dúvida, o mais fácil de ver listado são os últimos lançamentos de brinquedos, excessivamente anunciados em todos os canais e locais de convivência com a infância como coloquei acima.
No Natal passado li um texto interessante que vale resgatar e trazia um manifesto de uma organização Inglesa que discutia o significado da cartinha endereçada ao Papai Noel pelas crianças, além algumas dicas aos pais de como fazer um Natal mais humano e menos materialista- o que se mostra uma difícil tarefa nos dias de hoje onde o consumismo impera entre adultos e crianças e os bens materiais nos servem não somente como ingressos sociais, mas como uma forma de demonstração de afeto. Já esse ano vi outra manifestação linda acontecer e o mais bacana é pensar que fiz parte dela. Foi lançada pela Rebrinc (Rede Brasileira sobre Infância e Consumo) da qual faço parte junto com muitos outros “ativistas” uma campanha natalina chamada Natal das Dádivas que traz a ideia de uma maior presença de coisas importantes na vida do que os presentes em si. Que tal curtir e compartilhar? Acesse aqui.
E para fechar minha reflexão gostaria de dizer que na minha cartinha de Natal gostaria, portanto de endereçar um pedido não ao Papai Noel, mas sim aos adultos cuidadores de crianças, sejam eles pais, avós ou educadores. Será que não conseguimos conjuntamente lutar contra esse convite exagerado a compra de presentes e realizar uma festa natalina que envolva outro tipo de troca que não seja somente de presentes? Deixo aqui algumas dicas e para as outras conto com a imaginação de todos nós. Uma ideia bacana é pensarmos em presentes feitos em casa e junto com as crianças. Receitas, recortes, desenhos e colagens são bens vindos. Podemos também doar coisas para que as novas cheguem, pois brinquedos que para nossos filhos não tinham mais graça, podem se tornar novidades enormes para seus novos donos. Espero, portanto que nesse Natal as famílias consigam repensar a forma como temos lidado com o consumo nos dias de hoje para que nossas crianças consigam listar desejos mais humanos e honestos ao querido Papai Noel. Boas festas!