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Carioca, o rio do rio

Recuperar e renaturalizar

Imagem1Por Silvana Gontijo
Jornalista, escritora e especialista em educomunicação

Para uma mineira nascida e criada em Belo Horizonte, o Rio de Janeiro era o destino dos sonhos. Mineiramente eu tentava disfarçar o que podia ser entendido como uma traição às minhas origens e era mesmo. Como o viciado que tenta resistir à tentação, ou o apaixonado não correspondido que maldiz seu objeto de desejo eu queria, mas não podia admitir nem assumir, ser refém desce fascínio: o Rio. Hoje, quarenta anos depois de ter conquistado o meu Olimpo particular me sinto em casa e assumo que o Rio de Janeiro é um objeto de desejo. Morar no Rio é muito mais do que viver numa cidade é pertencer a um privilegiado contingente de deslumbrados com sua urbe. Cantada em prosa, verso e imagem a cidade e se define como incomparável.  Gente, natureza, cultura …  quem conhece, nunca esquece e esse é o primeiro passo para ser carioca.

Millôr Fernandes dizia “O carioca, todos sabem, é um cara nascido dois terços no Rio e outro terço em Minas, Ceará, Bahia, e São Paulo, sem falar em todos os outros Estados, sobretudo o maior deles o estado de espírito. (…). O carioca é, antes de tudo, e acima de tudo, um lúdico.” [1]

Vinícius reiterava pois a verdade é que ser carioca é antes de mais nada um estado de espírito.(…) Pois ser carioca, mais que ter nascido no Rio, é ter aderido à cidade e só se sentir completamente em casa, em meio à sua adorável desorganização.”[2]

Contudo, poucos cariocas sabem a razão dos nascidos aqui serem assim chamados. E tudo começa com um rio, não o de Janeiro, mas o Rio Carioca, que deu nome aos habitantes da cidade, origem a belíssimas lendas indígenas e inspirou artistas e naturalistas.

Esse mesmo rio que foi motivo de guerras pelo controle de sua água e a razão da construção dos famosos Arcos da Lapa, hoje tem a maior parte de seu curso sob a terra, carregando lixo e esgoto, sem vida e sem beleza, escondido como algo indesejável e vergonhoso.

Mas nem tudo está perdido, sua nascente e o trecho que corre dentro da Floresta da Tijuca são um testemunho de sua antiga Glória. Falando nisso a maior floresta urbana do mundo, segundo a revista Ciência Hoje, foi replantada e recuperada em 1861 exatamente para proteger as nascentes que abasteciam a cidade.

A qualidade das águas do Rio Carioca era afamada, e delas surgiu um ditado para se referir às boas coisas – “Isto é bom como a água do Carioca”.

Mas porque o rio que é o pai do Rio está esquecido, morto e enterrado? E é exatamente isso que eu gostaria responder com um desafio: vamos recuperar e renaturalizar o Rio Carioca? Claro que é impossível fazê-lo novamente saindo da floresta, descer o Cosme Velho, Laranjeiras, atravessar o Aterro, formar ilhas e lagos. Mas é possível limpá-lo, recuperar alguns trechos, torná-lo parte da paisagem e, sobretudo, contar sua história, que faz parte da história da cidade que faz 450 anos, em 2015.

Para se comemorar o aniversário de uma cidade como o Rio de Janeiro é preciso redescobrir e revisitar o que ela teve de bom, de bonito, de rico. Devemos, é claro, comemorar as conquistas do progresso, mas é importante trazer de volta os motivos que a fizeram ser uma cidade única. O próprio carioca precisa lembrar-se do privilégio de viver nesta cidade incomparável.

Recuperar o Rio Carioca será um legado digno das comemorações dos 450 anos do Rio de Janeiro e um exemplo para o Brasil.

Vamos nessa?

_________________________________________________________

[1] Texto extraído do livro “Que País é Este?“, Editora Nórdica – Rio de Janeiro, 1978, pág. 50.
[2] http://noticias.r7.com/blogs/pense-nisso/vinicius-de-moraes-e-o-jeito-que-so-o-carioca-sabe-ter-20131224/

Texto publicado originalmente no site do Planeta Sustentável

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