Por Marcus Tavares
Publicado inicialmente no Jornal O DIA – Opinião, em 08/02/2014
Promover uma Educação que contribua para a formação de crianças e adolescentes criativos, autônomos, responsáveis, solidários, participativos e críticos é, seguramente, uma das aspirações de muitos projetos políticos pedagógicos de escolas e, inclusive, de alguns cursos universitários. Desafio de que não se pode abrir mão. Entendo que os predicados listados acima são de igual importância. Mas destaco, principalmente, o último.
Hoje, mais do que nunca, a escola deve ter o compromisso de contribuir para a constituição de cidadãos críticos. Não me refiro à crítica como censura, depreciação. Mas, sim, à crítica como a capacidade de avaliar de forma contundente, de ser capaz de analisar os contextos, as entrelinhas, os interesses em jogo, de fazer conexões e pontes. Trata-se, sem dúvida alguma, de processo que não se aprende da noite para o dia. Processo, inclusive, influenciado pelo contexto social, cultural e econômico em que se vive. Daí a importância ainda maior da escola.
Independentemente de classe, gênero, cor ou idade, todos os cidadãos podem e devem desenvolver, exercer e praticar a criticidade. A mídia, sendo plural e diversa, tem poderoso papel de formação de opinião pública, que contribui para a construção do olhar crítico. Mas ela não pode ser vista, entendida e aceita como o oráculo da verdade.
Quer um exemplo? Nas últimas semanas, o Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (Conar), responsável por regular a publicidade no Brasil, diga-se de passagem, sem nenhuma força de lei, lançou uma campanha em que afirma que o órgão recebe, todos os dias, dezenas de reclamações. “Muitas são justas. Outras, nem tanto”, diz a campanha, que termina com a seguinte frase: “Confie em quem entende, confie no Conar.”
A campanha parece desqualificar a opinião do público que reclama dos abusos da publicidade, que é capaz de analisar o conteúdo e as imagens para além do simples entretenimento, do consumo fácil e do intervalo da programação. Nas entrelinhas, o Conar desqualifica tal público associando-o a cidadãos chatos, encrenqueiros e politicamente corretos. Ao deixar com ‘quem entende’, o público não precisa analisar, criticar, se preocupar com nada. Você concorda? Eu não.
Faça um exercício: procure saber quem integra o conselho do Conar. Quem então vai decidir por você? E, a partir disso, analise o teor da atual campanha. Está aí um bom exercício de olhar crítico, de olhar cidadão, que nada nem ninguém podem desqualificar. Muito menos subestimar.