Resenha de livro

Media and digital literacies in secondary school. Texto de Ilana Eleá.

Por Ilana Eleá

O livro Media and digital literacies in secondary school, lançado pela editora Peter Lang, dentro da série “Novas tecnologias e epistemologias digitais”,  foi apresentado no My Media Playground, seminário bianual de Mídia Educação, realizado em fevereiro de 2013, em Tampere, na Finlândia. A obra se baseou na pesquisa de pós-doutorado de Reijo Kupiainen, professor adjunto de mídia e educação do Departamento de Educação da Norwegian University of Science and Technology e da Universidade de Aalto.

Com a proposta de investigar os “encontros” entre as práticas de usos de mídia que jovens trazem para a escola e como a própria instituição escolar tem se estruturado para recebê-las, Kupiainen realizou um estudo etnográfico em uma turma de Ensino Médio de uma escola pública finlandesa. Nesse país, mídias e letramentos digitais não compõem uma disciplina específica, mas são trabalhadas de forma interdisciplinar. O sistema escolar finlandês, celebrado como um dos melhores do mundo por avaliações internacionais, define, como um dos principais objetivos para o século XXI, o aprimoramento de habilidades para o exercício da cidadania, o que inclui a formação para o uso responsável de serviços digitais e a constituição de consumidores críticos e produtores de conteúdos criativos.

Para o autor, o espaço da escola pode ser visto como duplicado por apresentar tanto ambientes formais quanto informais de aprendizagem. Se jovens estão produzindo curtas-metragens, escrevendo fanfictions, fotografando e escrevendo blogs na escola, tais práticas podem ser estudadas como produções criativas de mídia por jovens – fruto de novas formas de aprendizagem. O foco está nos significados que especialmente crianças e jovens atribuem aos seus usos cotidianos de mídia.

A escola, na qual o estudo se realizou, conta com 400 estudantes e 40 professores. O pesquisador permaneceu na instituição durante um ano letivo, acompanhando, de 3 a 10 horas por semana, uma turma de estudantes com 14 e 15 anos de idade, observando especificamente as aulas de finlandês e de artes visuais.

Caderno de campo manuscrito, entrevistas semi-estruturadas audio gravadas, câmeras de vídeo e de foto foram utilizadas, procedidas de um survey sobre usos de mídia. Para evitar tradicionais dicotomias entre online/offline, mundo real/virtual e espaço físico/ciberespaço, Kupiainen optou pela abordagem que denomina como connective ethnography. Por esta, a etnografia não se limita a observação do espaço físico da escola, mas inclui o acompanhamento online de blogs de estudantes, seus canais no You Tube e perfis em redes sociais. O autor defende a posição das teorias de letramento socioculturais, pelas quais os letramentos digitais são entendidos como práticas sociais plurais, podendo apenas ser entendidos se situados em contextos sociais, culturais e históricos (Lankshear and Knobel, 2006).

Kupiainen apresenta uma discussão teórica sobre o conceito de espaço escolar que abriga estratégias e táticas. Estratégias e táticas são entendidas, por Michel de Certau (1984), como correspondentes às forças de produção e de consumo. Estratégias seriam lógicas de administração interna de instituições, como as empregas pelas escolas ao definir tempos, vigilâncias, disciplinas e como as utilizadas pelos professores para o ensino. Já as táticas seriam relativas ao universo da resistência, que podem ser representadas pelas práticas de alunos a burlar regras estabelecidas. O uso de telefone celular em sala de aula é citado como exemplo. Faz parte da estratégia escolar restringir o uso, assim como da tática de alunos encontrar meios para burlar tal regra. São tensões entre estratégias e táticas relativas à área de mídia e educação que o autor se propõe a investigar durante a pesquisa.

Durante a observação,ficou claro que os telefones celulares são um dos meios mais utilizados no cotidiano dos alunos, mas os professores não exploram suas potencialidades, como câmera e microfone, para atividades escolares ou tarefas para casa. O livro ainda parece ter mais peso, até por parecer mais apropriado para aulas que têm duração de 45 minutos. O espaço escolar não parece desenhado de forma apropriada para abraçar projetos de mídia e de mídia e educação. A falta de tempo seria um dos problemas.

Pensar a produção criativa de mídia por jovens também ganha relevo no livro. O modelo de Andrew Burn e James Durran (2007) privilegia um padrão de produção que dá conta dos aspectos cultural, criativo e crítico. Mas será que a facilidade e o sem número de rápidas publicações favorecidas pela plataforma 2.0 da web estão oferecendo uma quantidade de produtos de mídia sem qualidade? Para alguns estudiosos, como Andrew Keen, estamos diante de uma ‘floresta digital de mediocridade’, não havendo mais espaço para obras de arte.

Para Kupiainen, os jovens não estão preocupados em criar obras de arte, mas em ter diversão e colaborar com seus amigos, o que deve ser visto com um grande avanço. Isso não quer dizer que a crítica em relação à mediocridade deva ser desprezada. O autor finlandês apresenta observações sobre produção de mídia por jovens em três contextos: práticas baseadas na comunidade escolar, práticas extraescolares e práticas baseadas no currículo escolar.

Com reflexões teóricas acompanhadas de descrições etnográficas detalhadas, Kupiainen apresenta um livro essencial para quem quer problematizar práticas de mídia na escola e na vida dos jovens de hoje.

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