Por Maria de Fátima Caridade da Silva
Mestre em Educação pela Universidade Católica de Petrópolis
Por que refletir sobre este tema?
Muito se tem discutido acerca da inserção de recursos tecnológicos no ambiente escolar, fato justificável pela sua forte presença no nosso cotidiano, tornando-se necessário o uso destes recursos pela escola, trazendo mudanças significativas para a educação, aproximando-a do contexto global. Tais recursos podem favorecer o aprendizado, a construção dos processos cognitivos, apreensões e percepções do mundo, vindo dessa forma incentivar o ensino e promover a aprendizagem tanto de alunos como de professores.
Segundo Stahl (1997), os sistemas educacionais podem ser potencialmente afetados pelas tecnologias, assim como o processo de ensino-aprendizagem, as habilidades de pensamento e os papéis de professores e alunos. Embora a tecnologia seja um elemento bastante expressivo da cultura atual, ela precisa ser devidamente compreendida em termos das implicações do seu uso no processo de ensino e aprendizagem. Esta compreensão é que permite ao professor integrá-la à prática pedagógica, sabendo que ela não resolve todos os problemas da educação, uma vez que a sua inclusão não significa necessariamente mudança. Apenas incluir a tecnologia na escola não significa que haverá aprendizagem. É a mediação pedagógica do professor que efetiva a construção do conhecimento, com o uso da tecnologia ou não.
Diante de uma realidade tão complexa, esta pesquisa, inserida na moderna sociedade tecnológica, propôs o desenvolvimento de um estudo sobre o uso da televisão e do vídeo em cursos de formação de professores de História, ou seja, investigar se os professores desses cursos oferecem aos seus alunos, futuros professores, oportunidade de alfabetização tecnológica (Sampaio e Leite, 2003) em relação à televisão e ao vídeo.
Para atingir este objetivo, buscamos responder as seguintes questões de estudo:
1- Qual o papel pedagógico da TV e do vídeo na sociedade atual?
2- Como se dá o processo de alfabetização tecnológica do professor quanto à TV e vídeo em cursos de formação de professores?
3- Como os professores desses cursos utilizam a TV e o vídeo nas suas práticas pedagógicas?
4- Como os alunos desses cursos (futuros professores) percebem o seu processo de alfabetização tecnológica em relação à televisão e ao vídeo?
Pelo que foi exposto, na sociedade atual, torna-se necessário refletir sobre o domínio das tecnologias e seus usos na escola como integrantes da formação inicial do professor, garantindo uma base de conhecimentos para a sua atuação na sala de aula. Mais uma vez a televisão e o vídeo podem apresentar uma possibilidade pedagógica relevante neste contexto.
A formação do professor para o uso das novas tecnologiasOs professores precisam atuar sobre as gerações que se formam de maneira significativa e crítica. Para que tal fato se concretize Belloni (1998) aponta para as seguintes necessidades: em primeiro lugar redefinir o papel do educador, a complexidade de suas tarefas exige uma formação inicial e continuada totalmente nova. Como formar o professor que a escola atual exige? A redefinição do papel do professor relaciona-se diretamente com a sua formação. Em segundo lugar, encontra-se a comunicação, que é o meio através do qual os seres humanos constroem o seu saber, principalmente a sua cultura.
A autora chama a atenção para a necessidade de reflexões sobre a inter-relação da educação com a comunicação, e que se complexificam com a entrada das tecnologias.
Para que o uso da tecnologia se concretize na escola se faz necessário uma alfabetização tecnológica. Da leitura de Sampaio e Leite (2003) emerge um conceito de alfabetização tecnológica que é dinâmico, capaz de acompanhar o ritmo do desenvolvimento tecnológico e a mutabilidade do mundo em que vivemos. Segundo as autoras este uso envolve o domínio contínuo e crescente das tecnologias que estão na escola e na sociedade, mediante o relacionamento crítico com elas. Este domínio se traduz em uma percepção do papel das tecnologias na organização do mundo atual – no que se refere aos aspectos locais e globais – e na capacidade do(a) professor(a) em lidar com essas diversas tecnologias, interpretando sua linguagem e criando novas formas de expressão, além de distinguir como, quando e por que são importantes e devem ser utilizadas no processo educativo (p.100).
Num contexto mais amplo, esta alfabetização já faz parte da educação geral do indivíduo e a escola intervém formando o sujeito reflexivo, capaz de avaliar a validade ou não da tecnologia; envolve o aproveitamento das novas habilidades mentais desenvolvidas pelas crianças através de uma abordagem multimídica, cuja linguagem ao ser incorporada possibilita que a escola diminua a distância entre ela e os jovens; indica que há necessidade de trabalhar criticamente as informações e os valores que são transmitidos pelas tecnologias.
A tecnologia deve ser usada para uma ação transformadora da sala de aula: o professor deve utilizá-la criticamente em situações criadas a partir da realidade do aluno, praticando novas propostas pedagógicas na construção do conhecimento, visando atuação crítica e reflexiva do aluno sobre a realidade.
Pensando a TV e o vídeo na construção do conhecimento
Sendo a sociedade contemporânea caracterizada pela multiplicidade de linguagens e pela forte influência dos meios, mediadores entre a realidade e as pessoas, não se justifica mais que a educação se limite a alfabetizar para o uso da palavra escrita, esquecendo-se da educação para a leitura da imagem, sendo que ambos são instrumentos de comunicação importantes. As linguagens do cinema, da TV e do vídeo são desdobramentos de formas de olhar e registrar, fazendo-se necessário uma leitura crítica desses meios de comunicação.
Para Belloni (2001), dentre as mídias, a televisão apresenta-se como uma presença constante e aparentemente gratificante para os jovens, o que confirma o seu importante papel como socializadora das novas gerações, constituindo-se num poderoso fator de reprodução social e num mecanismo eficaz de controle. A autora aponta a televisão como transmissora do saber acumulado e de informações sobre a atualidade, representações do mundo e regras de integração social. As crianças se apropriam e reelaboram essas significações “a partir de suas experiências e integram-se ao mundo vivido no decorrer de novas experiências” (p. 34). Destaca o vídeo como “a mídia mais freqüentada e que transformou a vida cotidiana de muitos povos e certamente o imaginário infanto-juvenil em escala planetária” (p. 18).
Diante deste amplo leque de novas configurações trazidas pela TV e pelo vídeo que se refletem na sala de aula, destaca-se o papel do professor, como aquele que deve introduzir, segundo Belloni (2001, p. 18) tanto “questões éticas (conteúdos e mensagens) quanto aspectos estéticos (imagens, linguagens, modos de percepção, pensamento e expressão)” realçando-se a necessidade de alfabetização tecnológica, neste caso, para uso específico de televisão e do vídeo. Percebemos, assim, a necessidade de incluir a alfabetização tecnológica do professor na formação de professores e na formação continuada, sendo extensiva aos alunos e demais profissionais da educação. Em síntese, o professor é um elemento ativo na prática educativa, cuja dinâmica poderá integrar e interligar a escola à realidade dos alunos.
A realização da pesquisa
Devido à significância social dos cursos de formação de professores e a importância da introdução do vídeo/televisão na prática pedagógica dos professores para que os seus alunos, futuros professores, também sejam capazes de fazer o mesmo em suas salas de aula realizando uma prática pedagógica condizente com a sociedade moderna, escolheu-se o curso de História de três universidades públicas do Estado do Rio de Janeiro para o desenvolvimento desta pesquisa e que possuem licenciatura em História. Duas são federais e uma estadual e estão localizadas na área metropolitana do estado do Rio de Janeiro, a saber: Universidade Estadual do Rio de Janeiro, Universidade Federal Fluminense e Universidade Federal Rio de Janeiro (unidade de São Gonçalo).
O questionário foi aplicado aos alunos e as entrevistas a quatro professores de prática de ensino das universidades pesquisadas. Os 50 alunos escolhidos estão matriculados no curso de História no ano de 2004, e cursando as disciplinas pedagógicas. Teoricamente estariam em melhores condições para responder às questões da pesquisa, por possuir maior vivência com os recursos tecnológicos da televisão e do vídeo no desenvolvimento do seu curso do que os alunos dos períodos iniciais.
Revelações da pesquisa
Entre as principais conclusões podemos confirmar que há uma forte presença dos meios de comunicação, principalmente da televisão no cotidiano das pessoas. Este fato justifica que estas mídias sejam integradas ao processo pedagógico e também, porque são formadoras de sentidos, transmitindo valores, ideologias e representações das classes dominantes, através de conteúdos que precisam ser estudados e analisados. Assim, a História se apresenta como uma disciplina capaz de inserir no seu currículo a televisão e o vídeo trabalhados nesta perspectiva; e estes aspectos se fazem presentes nas falas dos alunos, conforme revelado nos dados analisados.
Para que as tecnologias possam ser integradas ao ambiente escolar, há necessidade de que o professor se sinta seguro, dominando aspectos técnicos, didáticos e pedagógicos da educação, fazendo uma apropriação crítica das mesmas, pois as tecnologias não são neutras, alteram a forma como pensamos, desenvolvem novas capacidades cognitivas e perceptivas. A análise dos dados indicou que habilitar o licenciando para o uso da televisão e do vídeo não faz parte do currículo de História (grade curricular), mas se faz presente, mesmo que de maneira dispersa, da prática dos professores de sala de aula. Constatou-se que os professores da graduação revelaram uma preocupação em desenvolver um uso crítico destas tecnologias, embora não seja um tema incluído no currículo de prática de ensino.
Do ponto de vista dos alunos da graduação, ou seja, como os licenciandos percebem o seu processo de alfabetização tecnológica em relação a estas duas mídias, constatou-se que quase todos os alunos participantes revelaram que se sentem relativamente seguros em relação a sua alfabetização tecnológica, pois na sua quase totalidade, farão uso da televisão e do vídeo em suas futuras práticas pedagógicas.
Os licenciados indicaram que não há necessidade de incluir uma disciplina obrigatória para ensinar o uso da televisão e do vídeo, mas recomenda-se uma disciplina específica e optativa que trabalhe com os professores a utilização dos diferentes recursos tecnológicos nas suas futuras aulas.
A pesquisa revelou que as mídias são utilizadas predominantemente como ferramentas, havendo necessidade de uma educação para as mídias, principalmente no que se refere ao uso de programas de televisão. A leitura crítica refere-se predominantemente aos filmes. Recomenda-se que a leitura ideológica de programas de televisão, noticiários, novelas e propagandas também deveriam ser incluídos nestas leituras críticas, assim como a compreensão dos objetivos em relação ao consumo e a maneira como a persuasão funciona nas mensagens publicitárias.
Na formação para a cidadania, estaria incluída a melhoria da qualificação dos alunos e dos professores como telespectadores capacitados para a leitura audiovisual. Na busca deste caminho, procurou-se, neste estudo, reflexões para que o uso pedagógico da televisão e do vídeo nos cursos de formação de professores pudesse contribuir para se repensar o ensino, principalmente o de História, tornando mais significativos para os alunos a aprendizagem de seus conteúdos. Conclui-se, então, que o professor é o intelectual transformador, conscietizador e crítico da sociedade e que a escola deve desenvolver a leitura ideológica propiciada pela TV como exercício para a construção da autonomia e da cidadania, como forma de neutralizar a conformidade, a esterilidade e a banalidade destes tempos pós-modernos.
Referências bibliográficas
– BELONI, Maria Luiza. Tecnologia e formação de professores: Rumo a uma pedagogia pós-moderna? In: Revista Educação e Sociedade. Ano XIX/dezembro/1998, nº 65 CEDES, p. 143 162.
________________. O que é mídia-educação. Campinas, SP: Autores Associados, 2001.
– SAMPAIO, Marisa Narciso; Leite, Lígia Silva. Alfabetização tecnológica do professor. Petrópolis, RJ: Vozes, 2003.
– STAHL, M. Formação de professores para uso das novas tecnologias de comunicação e informação. In: CANDAU, V.M. (Org). Magistério: construção cotidiana. Petrópolis, RJ: Vozes, 1997. p. 292-317
O uso do computador pelos profesores em sala de aula tem acontecido lentamente por falta de projetos bem elaborados para a capacitação profissional em serviço para esta finalidade. Os NTE não estão dando conta do numeros de profesores a ser capacitado.
Muito importante a reflexão sobre este tema numa área que tem entre os filmes e documentários ou entrevistas na TV e no vídeo um arsenal que muito pode contribuir e enriquecer as aulas de História. A História é exatamente isso, o desenrolar da vida. Por isso mesmo o professor de História deve estar sempre antenado às novidades e aos acontecimentos e lançar mão de todo tipo de recurso que facilite a compreensão e desperte o interesse de seus alunos. A inclusão de disciplinas que forneçam ao futuro professor de História o cabedal necessário a utilização dos recursos digitais em sala de aula é muito bem vinda. Como disciplina do currículo esse aluno/professor terá condições de desenvolver seu senso crítico e estético para, futuramente, exercer muito bem seu papel de orientador na aprendizagem de seus jovens estudantes.