Por Silvia Adrião
Pedagoga, especialista em Construtivismo/Educação e Mestre em Sociologia da Educação.
Artigo originalmente publicado no site da Rebrinc
Não, eu não trabalho para dar tudo o que você quer. Não seria justo com você. Não seria bom para você. Dar a você o poder de conseguir “tudo” o que quiser (falando de bens materiais) seria uma forma de deixá-lo sempre insatisfeito com o que tem. Uma forma de esvaziá-lo de valores fundamentais. Seria uma forma de enganar você sobre as dificuldades da vida. Seria injusto porque lhe tiraria o direito de sentir aquela realização prazerosa quando conquistamos algumas coisas que foram demoradas para conquistar. Seria injusto porque o transformaria em um indivíduo cheio de coisas e vazio de experiências e de sensações que enriquecem verdadeiramente a vida. Não seria positivo para você conseguir tudo assim, tão facilmente, pois lhe tiraria o poder transformador que só as adversidades e a capacidade de criar e se adaptar com o que temos trazem. Eu não quero isso para você.
Acima de tudo, trabalhar para poder dar tudo o que uma criança quer é em si uma grande inversão de valores. Porque, se chegarmos bem perto, se nos permitirmos escutar o que a criança realmente quer, saberíamos que não estamos falando de coisas. Criança, na sua essência, não quer telefone, vídeo game ou bonecas caras. Criança quer companhia, quer natureza. Criança quer encontrar com outras crianças. Crianças querem a chuva e o bolinho de chuva. Querem o vento, folhas, gravetos e muita lama. Querem um mergulho no mar, cavoucar a na areia e comer pipoca. Criança quer histórias de medo, lamber a massa do bolo e brincar de pega-pega. Quer colo e cafuné.
Se eu pudesse, trabalharia menos, aí sim poderia lhe dar exatamente tudo o que você quer. Mas esta é uma outra reflexão que fica para um outro dia.