Por Pedro Rovai
Produtor e cineasta. Criador da série Tainá
Ao ensejo do Festival de Brasília do Cinema Brasileiro de 2011, criamos a bancada do cinema infanto-juvenil brasileiro, que tem como objetivo principal defender políticas de estímulo ao desenvolvimento do cinema infanto-juvenil no país. Por seu intermédio, a comunidade cinematográfica nacional está tomando iniciativas que incentivem políticas públicas e práticas de mercado que venham a libertar a produção nacional para crianças e adolescentes de preconceitos arraigados, da subestimação institucionalizada, da carência material crônica, que impede a ampliação da produção cinematográfica brasileira voltada para esse público. Tal situação nos deixa a mercê das produções internacionais, sem condições de competir com o produto estrangeiro, submetendo nossas crianças e jovens à cultura importada e impedindo-lhes de conhecer os valores e a cultura brasileira. São muitos os países que reconhecem a importância dos filmes infanto-juvenis na formação de novas plateias. Geração após geração, eles tornam perene o interesse do público pelas suas cinematografias.
Esse reconhecimento reflete-se em políticas públicas e/ou práticas de mercado que garantem o futuro tanto do audiovisual em geral quanto da cinematografia de cada país em particular, tomando-se por base os filmes para crianças e adolescentes.
Nos Estados Unidos, onde impera a economia de mercado, a comunidade cinematográfica cultiva, há décadas, a consciência plena de que as plateias mais jovens ajudam a manter a histórica hegemonia da produção estadunidense.
Em países onde o apoio governamental é indispensável, o poder público tem e aplica essa percepção. Destacam-se dois exemplos: na Dinamarca, a legislação determina que 25% dos recursos para o audiovisual sejam investidos na produção de filmes infanto-juvenis; na Suécia, o Film Agreement, em um contrato envolvendo as entidades de direito público e de direito privado na área do cinema, estabelece esse mesmo percentual.
Em nosso país, é crônica a carência de filmes infanto-juvenis brasileiros. A produção importada, notadamente dos EUA, ocupa quase todo o espaço junto a esse público. Assumindo as proporções de uma invasão cultural e uma ocupação territorial do setor, a presença massiva do audiovisual alienígena tornou-se gritante nos cinemas, agressiva na televisão e alarmante em todas as janelas.
Dos quase cem filmes de longa metragem produzidos anualmente no nosso país, menos de três por cento são direcionados a esse público. Na indústria livreira nacional, o livro infantil brasileiro, seus grandes autores e seus ricos personagens, ocupam um importante e decisivo papel na formação cultural de nossas crianças. Isto sem mencionar a relevância econômica desse segmento no mercado editorial como um todo.
Não é admissível, portanto, que o cinema infantil brasileiro, por ausência de políticas criativas que busquem equanimidade nos investimentos e nos patrocínios, continue na situação de abandono em que está. Considerando a realidade do cinema infanto-juvenil brasileiro e a urgente necessidade de adoção de iniciativas que alterem esse quadro, a bancada do cinema infanto-juvenil propõe um programa de ação que parta da seguinte plataforma básica.
1 – Demonstrar aos poderes públicos (Congresso Nacional, Ancine, Ministério da Cultura, Governo Estaduais) que a adoção de uma política inspirada nos exemplos citados (Dinamarca, Suécia) seria um ponto de partida eficaz, com a destinação, para a produção infanto-juvenil, de 25 por cento dos recursos aplicados em programas de desenvolvimento do audiovisual por meio dos incentivos fiscais existentes e dos fundos de apoio a atividade.
2 – Defender junto à secretaria de comunicação da Presidência da República que os patrocínios das empresas estatais e de economia mista que invistam o mesmo percentual de 25% para projetos infanto-juvenis, demonstrando os benefícios culturais, sociais e de mercado que adviriam a partir dessas políticas.
3 – Demonstrar à Ancine a necessidade da criação imediata de uma política de fomento voltada para as distribuidoras, incentivando-as e capacitando-as a aplicar maiores recursos na publicidade e na distribuição dos filmes infanto-juvenis brasileiros, de modo a aumentar a competitividade deles diante da produção importada.
4- Envolver o MEC e as TVs públicas em um amplo programa de difusão do acervo existente e em parcerias para projetos futuros, dentro dos mesmos princípios que os adotados para a difusão do livro infantil brasileiro.
A bancada do cinema infanto-juvenil coloca-se à disposição dos entes da sociedade civil e do poder público, para, em curto prazo e em intensa colaboração, realizarmos o mais amplo debate e aprimoramento desta plataforma, buscando concretizá-la. O cinema brasileiro como riqueza da cidadania, a saúde cultural de nossas crianças e jovens e a independência do Brasil não podem mais esperar.
A formação da bancada nasceu da ideia do cineasta de Brasília, Marcio Curi, durante o Seminário “Cinema Infantil Brasileiro: Trajetória e Futuro”, que aconteceu no Festival de Brasília do Cinema Brasileiro. O texto, de autoria de Pedro Rovai, foi distribuído para os principais participantes do evento, entre eles Ziraldo, Diler Trindade, Nilson Rodrigues, a coordenadora do seminário, Anna Karina, e o próprio Marcio Curi.